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Caminho para o abismo

Neste artigo, Paulo Cassiano Jr. aborda a violência contra professores

Artigo
Por Paulo Cassiano Júnior
7 de julho de 2019 - 12h45

“Vem dá (sic) aula pra mim, sua gata gostosa, vem no 1º B e 2º C”. A frase, grosseira em qualquer circunstância, foi pichada por alunos de uma escola pública de Campinas no carro de uma professora de Educação Física, a qual preferiu não se identificar, por motivo de segurança. O medo da docente em revelar a sua própria identidade não é à toa.

A mais recente pesquisa da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico, realizada com mais de 100 mil professores e diretores de escola dos ensinos fundamental e médio, posicionou o Brasil no topo do “ranking” mundial da violência em escolas. Por aqui, 12,5% dos entrevistados disseram ser vítimas de agressões verbais ou de intimidação de alunos pelo menos uma vez por semana, um índice quase quatro vezes maior do que a média dos 34 países pesquisados.

A violência contra professores já seria inaceitável caso se limitasse a ameaças e ofensas. Nos últimos tempos, porém, episódios de agressão física em sala de aula têm crescido assustadoramente. Em Carapicuíba (SP), uma professora foi expulsa de sala pelos alunos, que arremessaram contra ela livros, cadernos, até,carteiras. A cena foi filmada e divulgada em mídias sociais pelos próprios estudantes. Descrita como uma pessoa tranquila, a educadora foi internada com surto emocional e ataques convulsivos.

Estudos sobre o assunto apontam como causa central da violência nas escolas a imersão numa sociedade cada vez mais violenta. Jovens e adolescentes pobres, moradores das periferias, expostos crua e diariamente a todo tipo de violência, desigualdade e exclusão,constituem a massa que frequenta nossos colégios públicos. A escola não fica alheia à violência praticada fora de seus muros.

Outro fator que ajuda a explicar o fenômeno é a crise na família. Pais sobrecarregados ou ausentes não acompanham adequadamente o desenvolvimento escolar dos filhos. Crianças que não recebem limites dentro de casa não enxergarão professores e diretores como figuras de autoridade nem acatarão regras sociais. Até um passado recente, as famílias respaldavam a escola na disciplina dos filhos, pois a identificavam como parceira no processo de educação (ai da criança cujo responsável era comunicado de algum ato de insubordinação!); atualmente, os próprios pais se insurgem contra os professores para defender seus pequenos reizinhos rebeldes.

Ainda de acordo com especialistas, a desestruturação da própria escola também contribui para esse quadro. Instalações físicas precárias, grade curricular anacrônica, salas de aula lotadas, há muito a escola deixou de capturar a atenção e o interesse do jovem. Além disso, os professores e diretores sofrem com baixa qualificação, salários aviltantes e péssimas condições de trabalho. A desmotivação e a baixa autoestima são gerais! Se a escola já não é um ambiente agradável, nem considerada digna de valor, torna-se mais suscetível à prática de incivilidades e atos violentos.

Esse assunto é tão grave e complexo que parece não ser resolvido apenas com a refundação da escola brasileira. Talvez seja necessário mesmo reinventar a sociedade. Afinal, quando crianças e adolescentes vão à escola dar na cara de seus professores,tudo caminha para o abismo.