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Jornalista campista é apontado pelo MP-RJ como “funcionário que recebeu mais dinheiro” de suposto esquema na Ceperj

Fabrício Manhães Cabral teria sido indicado por Helinho Nanhim, acumularia funções em dois projetos e já teria movimentado R$ 122,8 mil só este ano

Política
Por Redação
4 de agosto de 2022 - 14h12

Em nova reportagem sobre o suposto esquema envolvendo a manutenção de cargos secretos na Fundação Ceperj (Centro Estadual de Estatísticas, Pesquisas e Formação de Servidores Públicos do Rio), publicada nesta quinta-feira (4) pelo portal UOL, o jornalista campista Fabrício Manhães Cabral é apontado como “o funcionário que recebeu mais dinheiro” do órgão, no qual teria ingressado por indicação do vereador por Campos Helinho Nahim (Agir). De acordo com investigação do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (MP-RJ), ele teria movimentado R$ 122,8 mil somente nos primeiros sete meses deste ano. Os valores seriam relativos a funções em dois projetos distintos. Questionado pelo portal, Cabral, que atendeu à ligação do UOL como assessor de Nahim, não teria conseguido explicar suas funções.

A equipe de reportagem do Jornal Terceira Via tentou contato tanto com Cabral quanto com Nahim, mas não havia obtido retorno até a publicação desta reportagem. Tanto o jornalista quanto o vereador foram procurados tanto por meio de ligações quanto por aplicativos de mensagens instantâneas, mas não se posicionaram.

De acordo com a reportagem do UOL, Cabral admitiu que acumula funções em dois projetos ao mesmo tempo. Ele confirmou que foi indicado pelo vereador de Campos dos Goytacazes Helinho Nahim (Agir), aliado do líder do governo Cláudio Castro (PL) na Alerj (Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro), Rodrigo Bacellar (PL).

Cabral recebeu de janeiro a julho dois pagamentos por mês: um de R$ 8.849 e outro de R$ 8.700. De acordo com a planilha enviada pelo banco Bradesco ao MP, com exceção do último pagamento, de R$ 8.700, todo o restante foi sacado na boca do caixa, em dinheiro vivo.

A Fundação Ceperj afirmou em nota que Cabral é “superintendente de projetos”. “Ele não está vinculado a apenas um único [projeto], sendo responsável pela gestão de suas equipes”, disse o órgão.

O vereador Helinho Nahim. (Foto: Divulgação)

A Ceperj disse ainda que o “prestador de serviços recebe de acordo com suas entregas, produção, nível de complexidade e responsabilidade de projetos” e que “não há impedimento legal para que ele participe de mais de um projeto, desde que tenha disponibilidade de horário”.

A Secretaria de Governo disse que desconhece a indicação do vereador Helinho Nahim.

Na ação que entrou contra a Ceperj, o MP-RJ aponta indícios de irregularidades no acúmulo de funções na Ceperj, por serem “atividades que haveriam de ser desempenhadas em caráter permanente, ao longo de todo o período de duração do projeto, e cuja execução demanda subordinação, carga horária semanal mínima, controle de frequência, e pagamento de remuneração mensal sistemática e contínua”.

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Salários sacados em dinheiro

Conforme o UOL revelou, o MP-RJ detectou que R$ 226 milhões foram sacados em dinheiro por funcionários da Ceperj neste ano. O volume em espécie representa 91% de tudo o que a fundação pagou a eles entre janeiro e julho (R$ 248,9 milhões).

Dos 14 salários recebidos pelo jornalista, cinco foram retirados em dinheiro na agência de Campos dos Goytacazes, no norte fluminense, a mesma em que os promotores constataram saques de mais de R$ 500 mil em apenas um dia (14 de junho). Na capital, foram dois saques no bairro da Glória, dois no Catete, três no Centro, além de um depósito em conta corrente também na Glória.

Tanto Cabral quanto Helinho Nahim —com quem o UOL também conversou por telefone— confirmaram que a indicação para o cargo foi do vereador. O jornalista trabalhou oficialmente como chefe de gabinete na Câmara de Campos até dezembro, com salário de R$ 4.511.

Inicialmente, Nahim falou —de forma genérica— que indicou Cabral para o “governo”. Depois de alguma insistência, afirmou que o indicou para a Secretaria de Governo, quando a pasta era comandada por Rodrigo Bacellar.

“Eu sou vereador da base do deputado Rodrigo Bacellar. Isso é público e notório”, disse Nahim.

Procurado pela reportagem, por meio de sua assessoria de imprensa, o deputado estadual Rodrigo Bacellar não se pronunciou.

Ao UOL, Cabral teve dificuldade em explicar exatamente o que faz na Ceperj. Após insistência, ele encerrou a ligação. Veja trechos da entrevista:

UOL – Boa tarde, Fabrício, você é assessor do Helinho [vereador]?

Fabrício Cabral – Isso.

UOL – Como você concilia a função de assessor do vereador e as duas na Ceperj?

Fabrício Cabral – Na verdade, não estou mais com o Helinho. Trabalhei com ele na campanha, mas hoje ele me indicou para morar no Rio e trabalho na Ceperj, fazendo levantamento dos dados, das informações do governo do estado.

UOL – Você disse inicialmente que é assessor do Helinho.

Fabrício Cabral – Então, eu sou assessor dele porque sou diretamente ligado a ele. Só que ele é vereador em Campos e eu hoje moro no Rio de Janeiro.

UOL – Quais são os dois projetos da Ceperj em que você está?

Fabrício Cabral – Estou no meio ambiente e na educação.

UOL – E você faz exatamente o que nesse de meio ambiente?

Fabrício Cabral – O levantamento de informações no Portal da Transparência. A gente visita unidades também.

UOL – Mas em que projeto você trabalha?

Fabrício Cabral – É o Pacto RJ, observatório. E na educação, observatório da educação. Aí, toda a semana temos que fazer relatório divulgando dados através do Portal da Transparência. É um trabalho minucioso. Temos reuniões para organizar tudo certinho.

UOL – Como você concilia os dois empregos na Ceperj?

Fabrício Cabral – A gente consegue separar os tempos, tudo certinho. Nunca tive problema, me dedico exclusivamente a isso. É uma responsabilidade muito grande.

UOL – Esses relatórios que você faz estão disponíveis em algum lugar?

Fabrício Cabral – Esses relatórios ficam com a nossa supervisora. Tem um drive onde tem isso.

UOL – Não consegui entender exatamente o seu trabalho. Você consegue explicar melhor?

Fabrício Cabral – São todos os dados dos trabalhos, realizações do governo do estado em todas as regiões. Tudo o que foi feito nas escolas e nos trabalhos de meio ambiente.

UOL – Você foi indicado pelo Helinho?

Fabrício Cabral – Sim, pelo Helinho. Trabalho com ele há 19 anos.

UOL – Não ficou claro ainda para a gente o que você faz. Consegue explicar?

Fabrício Cabral – É um levantamento no Portal da Transparência e através de visitações. Cada um tem um núcleo, eu estou no núcleo da capital, entendeu?

UOL – Não entendi o objetivo da pesquisa que você faz?

Fabrício Cabral – Não é pesquisa. É um relatório que a gente recebe. E nesse relatório a gente tem que desenvolver todas as informações necessárias, entendeu?

UOL – Que informações? Se os dados já estão no Portal da Transparência, qual o sentido?

Fabrício Cabral – E como que chega no Portal da Transparência?

UOL – Então, você alimenta o portal, é isso?

Fabrício Cabral – Também ajudo. Encaminho o relatório para os supervisores que botam no portal. Todo o levantamento é feito.

UOL – Mas o que tem nesses relatórios?

Cabral desliga o telefone sem esclarecer o trabalho.

O que o UOL já revelou

Em reportagem exclusiva, o UOL mostrou em junho que o governo do Rio mantém ao menos 18 mil vagas de trabalho na Ceperj sem nenhuma transparência.

Levantamento feito com dados da Secretaria Estadual de Fazenda mostrou que Cláudio Castro aumentou em 25 vezes o orçamento da fundação desde que assumiu o cargo. Somente neste ano, o incremento chegou a R$ 300 milhões até junho.

Uma planilha elaborada pela Secretaria de Trabalho implica diretamente Castro no escândalo. O documento recebeu o nome de “governador” e tratava do orçamento para 9.000 cargos secretos. Procurada, a Secretaria de Trabalho afirmou que iria apurar se houve “um erro na confecção da planilha”.

Após a revelação do UOL, o governo chegou a colocar o documento sob sigilo, mas voltou atrás.

Reportagem exclusiva também mostrou que polos do programa Casa do Trabalhador, o maior dentre os que têm folhas de pagamento secretas, estão sendo controlados por pré-candidatos do Podemos, partido presidido pelo secretário de Trabalho e Renda, Patrique Welber. A pasta afirmou que “as unidades do projeto são equipamentos públicos e não têm finalidade político-partidária”.

A Ceperj usou um código genérico para esconder os beneficiados em R$ 284 milhões pagos aos cargos secretos.