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Biólogo considera viável reflorestamento e recuperação de áreas degradadas em Campos

Nilson Berriel é pesquisador da Uenf; ele defende a preservação da Mata Atlântica e do Parque Estadual do Desengano

Entrevista
Por Ocinei Trindade
3 de junho de 2022 - 9h40
Nilson Berriel é biólogo e mestre em Ecologia e Recursos Naturais (Foto: Acervo Pessoal)

O biólogo Nilson Berriel é mestre em Ecologia e Recursos Naturais pela Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro. Ele é um estudioso sobre questões ligadas ao desmatamento e reflorestamento na região de Campos dos Goytacazes. O pesquisador é citado na reportagem “Desmatamento ainda ameaça o Parque Estadual do Desengano” (clique aqui) publicada pelo Jornal Terceira Via. Nesta entrevista, ele analisa a situação da Mata Atlântica e da unidade de conservação na região.

Como avalia a situação da Mata Atlântica no Estado do Rio de Janeiro, principalmente em Campos dos Goytacazes?

Atualmente a Mata Atlântica cobre cerca de 18,7% do Estado (considerando as áreas regeneradas). A situação no Rio de Janeiro era estável e até promissora, mas nos últimos anos o desmatamento voltou a aumentar e tem provocado mais pressão sobre o bioma que já é muito fragmentado.

O município de Campos dos Goytacazes possui cerca de 8% do seu território coberto de Mata Atlântica, e vinha conseguindo manter o desmatamento controlado. Contudo, para o ano de 2020, o município voltou a apresentar um aumento na taxa de desmatamento. Assim, ficando dentre os municípios que mais desmataram no Estado do Rio.

No Brasil, a perda de cobertura vegetal está cada vez mais preocupante, pois além dos impactos causados diretamente na fauna e flora, os prejuízos em serviços ambientais são incontáveis e podem levar décadas ou centenas de anos para recuperá-los. Os impactos se estendem desde a oferta de chuva para algumas regiões do país a problemas de saúde pública, agravando a disseminação de patógenos, e até favorecendo o aparecimento de novas doenças. A agricultura é a maior dependente dos serviços fornecidos pelas florestas e a redução da vegetação florestal irá impactar diretamente nesse setor, trazendo prejuízos econômicos para o país.

Os vestígios de mata nativa em Campos estão mais concentrados no Parque Estadual do Desengano. Como observa esta unidade de conservação?

Sim, os vestígios de Mata Atlântica no município de Campos estão mais concentrados no entorno do Parque Estadual do Desengano, onde também se localizam duas Áreas de Proteção Ambiental (APA) municipais. A APA da Lagoa de Cima e a APA da Serra do Itaoca.

Existem outros fragmentos espalhados pelo município e que estão constantemente sendo alvo de estudos pelo grupo de Ecologia Vegetal da UENF. Contudo, estes fragmentos estão espalhados numa paisagem altamente fragmentada. Cercados, principalmente, por pastagem e plantios de cana, estes fragmentos florestais acabam perdendo algumas funções ecológicas diante do seu isolamento e do tamanho diminuto que possuem. Essa perda de funções ecológicas é agravada pela inexistência de corredores ecológicos entre os pequenos fragmentos, onde o isolamento impede o cruzamento de informações genéticas entre as espécies de fauna e flora, prejudicando o desenvolvimento e sobrevivência das espécies.

Berriel: “Infelizmente, os incentivos para reflorestamento e recuperação da MA na nossa região ainda são pequenos diante da proporção territorial”

Como observa a situação do desmatamento no município e na região?

É uma situação muito preocupante, pois o entorno do Parque Estadual do Desengano é uma área prioritária para conservação dentro do Estado do Rio. O desmatamento provoca impactos tanto à fauna quanto à flora local, que já são prejudicados pela fragmentação das áreas de mata. As bordas criadas com o desmatamento prejudicam a vegetação e as torna menos resilientes a eventos externos (como clima e vento). Essas ações podem expor todo ecossistema a riscos, causando impactos na saúde humana, alterações no ciclo hidrológico e diminuição da diversidade.

Neste caso, são necessárias ações conjuntas do poder público municipal e de outras esferas, a fim de garantir a fiscalização frequente do entorno do Parque, evitando a atividade madeireira ou de grilagem.

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Como vê a questão do reflorestamento e recuperação da Mata Atlântica na região?

Nós estamos na região mais desmatada do Estado (Norte e Noroeste Fluminense) e, infelizmente, os incentivos para reflorestamento e recuperação da MA na nossa região ainda são pequenos diante da proporção territorial que é subutilizada e mal utilizada.

Alguns locais de reflorestamento estão associados à recomposição de área em unidades de conservação. Como acontece na Estação Ecológica Estadual de Guaxindiba (EEEG), onde parte da área da unidade está passando por um processo de reflorestamento, de onde anteriormente havia pasto e cultivo de cana de açúcar.

Acredita ser possível recuperar áreas degradadas? De que maneira?

Com certeza é possível. São necessários mais investimento, conscientização e educação sobre o assunto, além de políticas públicas que incentivem estas ações. Um dos métodos utilizados para recuperar as áreas degradadas e manter uma produção agrícola são as agroflorestas. Um sistema que combina o plantio de espécies arbóreas e as espécies de cultura agrícola, recuperando o solo, a vegetação local e ainda possibilitando a produção agrícola.

Outro ponto é a recuperação de áreas em desuso e/ou Áreas de Preservação Permanente que foram desmatadas. Neste caso, é preciso uma avaliação do local para determinar com quais espécies deve se iniciar a restauração de acordo com as condições do solo e condições climáticas. Desta forma é feita a inserção de espécies vegetais características da região e do local para facilitar sua adequação ao ambiente e um crescimento mais rápido.

Qual o papel do poder público nessa questão de combate ao desmatamento?

O poder público é fundamental para o combate ao desmatamento, uma vez que as ações de fiscalização e punição dos infratores são de responsabilidades dos órgãos públicos. Mas não podemos contar só com a fiscalização e punição, também depende do poder público a formulação de leis e planos educacionais que visem orientar e conscientizar a população sobre a necessidade da preservação ambiental, assim como sua importância num cenário de mudanças climáticas e mitigação dessas mudanças.