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Não se combate crime com outro crime | Por Fernando da Silveira

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Artigo
Por Redação
22 de maio de 2022 - 0h01

 “A vingança é o pior dos crimes, pois fortalece e estimula todas as suas características aterrorizadoras”.
Moacyr Gomes de Azevedo.

Talvez algumas pessoas estejam convencidas de que eu vou ser repetitivo, se abordar novamente a linha de conduta do admirável Henrique de Navarra numa crônica. É que essas pessoas esquecem que o então rei de Navarra e da França permanece, mesmo em nossos dias, como alguém a nos convocar com os seus atos de bondade, para que lutemos por tempos melhores num mundo em que o ódio campeia. Tudo isso me vem à mente porque, ao esperar um médico no seu consultório, encontrei um ex-aluno, que também estava lá aguardando o nosso clínico. Tendo ele aproveitado a oportunidade para me agradecer por ter escrito uma crônica em que revelei o altruísmo de um Rei, que era ao mesmo tempo Monarca de Navarra e da França. E que proporcionou aos seus súditos o célebre “Édito de Nantes” concedendo para eles a liberdade religiosa. Limpando, assim, a podridão de uma época em que os criminosos confrontos entre católicos e protestantes eram a linha de conduta dos que viviam um momento aterrorizador, pois a matança era a regra. Algo do qual não escapou nem o próprio Henrique de Navarra ao ser assassinado por François Ravaillac.

Todavia, o meu ex-aluno me deixou profundamente triste, quando me disse que se vivesse nesta época na França ou em Navarra “não tergiversaria em torturar François Ravaillac, antes de mandá-lo para o inferno”. Em seguida, repeli cordialmente o que ele falou, dizendo que a desumana violência na punição de Ravaillac foi uma das causas de estar a bondade desaparecendo em nossos dias, pois o ódio sempre nos cega. Ou como diria Júlio Feydit, segundo o Professor Álvaro Duarte Barcelos: “A vingança desvairada, como sempre acontece, freia ao longo dos anos a possibilidade de um mundo melhor”. Estica o tempo do horror.

Pareceu-me importante dizer também para o meu ex-aluno que Ravaillac, monge tido como louco, foi punido da mesma maneira que o apóstolo Tiago, irmão de São João, por determinação de Herodes Agripa, em seu empenho de eliminar todos os cristãos. Insensatamente, Ravaillac foi também decapitado como São Tiago, seu corpo queimado e as cinzas jogadas ao vento. Este quadro de horror levou o meu ex-aluno a proclamar só para nós dois o seguinte: “Se Henrique de Navarra escapasse do assassinato, iria certamente até poupar da morte quem tentou matá-lo. Tudo para ser fiel às suas iniciativas voltadas para o amor ao próximo”. Sim, o meu ex-aluno passou a pensar e, possivelmente, a agir como cristão.

Por Fernando da Silveira – Jornalista, advogado e professor universitário