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Tiago Abud – O que só Carolina não viu

Tiago Abud - Articulista e Defensor Público

Artigo
Por Redação
27 de setembro de 2021 - 10h03
(Foto: Reprodução/Marcelo D. Macedo)

No ano de 2016, parte do povo brasileiro foi às ruas para pedir pelo impeachment da presidente da República. A economia estava mal das pernas e o partido da presidente envolvido em denúncias de corrupção. Qual Pilatos, acionado para barrar o processo político do impedimento, o STF deu de ombros.

Em 2018, por 6 votos contra 5, o STF decidiu firmar o entendimento da possibilidade da prisão em segunda instância, levando ao cárcere um ex-presidente da República. Privado de liberdade, o ex-presidente, já presidiário, foi impedido de concorrer ao cargo novamente, no momento em que liderava as pesquisas de intenção de votos. Não houve bater de panelas contrário à posição da Corte, mesmo estando ela, segundo dizem alguns juristas, em confronto com o texto constitucional, o que factualmente se comprovou com a mudança do posicionamento tempos depois. Mas Inês era morta, tinha gente presa e fora da disputa.

Até aqui Carolina acompanhava atenta a todos os movimentos da vida política brasileira. Ocorre que, vitimada por um acidente de trânsito, ficou em coma por quase três anos e perdeu algumas cenas. Contudo, no último dia 07.09, Carolina estava acordada. Mesmo de olhos abertos, postava-se incrédula, com a saída às ruas novamente de parte do povo brasileiro. A economia estava mal das pernas e o tema corrupção voltava à cena, entre rachadinhas e vacinas. O Estado social ruindo, preços nas alturas e volta da inflação, perceptível nas prateleiras dos supermercados. A incredulidade de Carolina nascia no fato de que a movimentação do dia era contra o STF, aquele mesmo que garantiu uma passagem tranquila ao projeto vencedor das eleições de 2018 e segura, com uma decisão, a investigação contra um dos membros do clã. Ruim esse STF, não? Para quem?

Entristecida por não entender o que ocorria, Carolina, aos prantos, se colocou a ver filmes. Depois de observar o Coronel Frank Fitts, de Beleza Americana, e a violência gratuita de Bacurau, o que Carolina não viu, passou a entender: o bode saiu da sala, amparado em forte propaganda, vindo para o centro da vida política brasileira. Nunca foi sobre corrupção. Mas sobre ódio, ressentimento, intolerância e, sobretudo, senso de oportunidade, tão comum às elites brasileiras, que levam os mais incautos a reboque. Uma faixa erguida por uma manifestante resume bem a ópera: “Xandão e Cia O Brasil não é uma favela! Aqui tem uma Constituição”. Sacou agora, Carolina? Esse texto não trata de A ou de B, mas de você, Carol.