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Impactos da suspensão do Censo 2021

Falta do recenseamento pode resultar em diminuição no repasse do Fundo de Participação dos Municípios

Geral
Por Redação
3 de maio de 2021 - 0h01
Feito a cada 10 anos, Censo Demográfico deveria ter tido nova edição no ano passado, mas Governo Federal decidiu postergar levantamento devido à pandemia (Foto: Arquivo/Silva Rust)

A humanidade vive a “era dos dados”. O trafego e o acesso à informações estão cada vez mais intensos e disponíveis, ditando comportamentos e ações estratégicas. Acontece que, na contramão desse processo, o Governo Federal anunciou, na última semana, a suspensão do Censo Demográfico elaborado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em 2021. A justificativa é a falta de verba orçamentária para essa finalidade. Na quarta-feira (28), o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Marco Aurélio Mello determinou a realização do Censo, mas essa decisão é liminar. O que se sabe é que, sob a ameaça de não haver atualização dos indicadores e dados estatísticos, municípios como Campos dos Goytacazes podem receber menos recursos e políticas públicas podem ser afetadas.

Em 2010, quando foi realizado o último Censo, Campos dos Goytacazes possuía 463.731 moradores. A cada ano, esses números são atualizados por estimativa, de acordo com a porcentagem de crescimento anual já identificada. Pressupõe-se, então, que o município tinha, em 2020, 511.168 habitantes, mas, com o passar do tempo, essa aproximação, que é abstrata, torna-se defasada. Por isso, o Censo Demográfico, estudo pormenorizado que permite o recolhimento de diversas outras informações, é feito a cada 10 anos. Uma nova edição do Censo deveria ter sido realizada em 2020, mas foi postergada em um ano por causa da pandemia. Caso a decisão do ministro se mantenha e haja recursos para tal, a amostra deve ser coletada ainda em 2021.

Sabe-se que os dados estatísticos provenientes do Censo permitem a identificação do perfil populacional de cada bairro, cidade e estado brasileiros, e revelam as taxas de emprego/desemprego e escolarização, características socioeconômicas e etnicorraciais das famílias, qualidade das habitações etc. e, assim, embasam as políticas públicas. Por meio de questionários aplicados em mais de 70 mil domicílios localizados em todos os 5.570 municípios brasileiros, é possível conhecer as necessidades da população e planejar ações a fim de melhorar a qualidade de vida das pessoas.

Prejuízos para os municípios
Para o cientista político José Luiz Viana, o principal prejuízo resultante da não realização do Censo é o déficit no coeficiente de repasse do Fundo de Participação dos Municípios feito pelo Governo Federal, uma das principais fontes de receita das prefeituras. Ele explica que essa verba pública é distribuída com base nos números do Censo; sem eles, alguns municípios podem receber mais ou menos verba do que o que seria justo.

“Quanto % a população de Campos cresceu nos últimos 10 anos? O Censo levanta, de forma concreta, em campo, essa informação. E o fundo de participação do município nas verbas federais é distribuído de acordo com a porcentagem desse crescimento. Isso só funciona tendo os dados de todos os municípios. Caso não haja Censo, ficaremos sem saber qual a real população de Campos, o percentual em relação aos outros municípios e, consequentemente, a porcentagem do fundo de participação. O município que cresceu muito de 2010 para cá poderá receber menos verba federal. Já aquele que cresceu menos receberá mais verba. Isso atinge diretamente a população”, explica.

Questionada sobre as consequências para o município de Campos, a Prefeitura destacou que os dados das esferas da habitação, economia, saúde, educação, dentre outras áreas, servem para diagnóstico à proposição de ações pela gestão pública.

“Sendo assim, o impacto não é específico para um programa da Prefeitura, mas atinge o Poder Público em sua integralidade. No entanto, a gestão permanece acompanhando as demais pesquisas disponibilizadas e realizando seus diagnósticos a partir das bases de dados disponíveis”, disse a gerente da Vigilância Socioassistencial da Secretaria Municipal de Desenvolvimento Humano e Social, Fernanda Cordeiro.

A socióloga Luciane Silva declara que a principal maneira de conhecer a população e promover mudanças sociais é coletar amostra censitária. “É a partir do Censo que nós conhecemos a situação de saúde, de fome, de emprego, de educação etc. de uma cidade. Estimamos que, em Campos, há 45 mil famílias em condição de fome e miséria, mas a verdade é que esse número pode ser muito maior, considerando o que temos visto nas ruas da cidade. Sem o Censo, ficamos no escuro, sem farol e sem direção para construção de política pública. Como pensarmos uma cidade sem saber quem vive nela? Esse é mais um capítulo da tragédia que temos vivido no Brasil. Não acessar esses dados é a declaração da falência da nação”, declara.

Liminar do TSE ordena realização do Censo, mas ainda cabe recurso (Foto: Divulgação)

Adiado em 2020, Censo pode não acontecer este ano
Na última semana, o secretário especial de Fazenda do Ministério da Economia, Waldery Rodrigues, declarou que o Censo do IBGE não seria realizado em 2021. A justificativa apresentada foi a falta de previsão de recursos no orçamento sancionado pelo presidente da República, Jair Bolsonaro (sem partido). O anúncio foi recebido com revolta por especialistas, que afirmam que haverá perda de qualidade das políticas sociais, redução na distribuição de recursos para os municípios e descompasso nas pesquisas.

Na quarta-feira (28), o ministro do STF, Marco Aurélio Mello, determinou, de forma monocrática, que o governo federal realize o Censo 2021. Na decisão liminar, o magistrado afirma que a União e o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), ao deixarem de realizar o estudo, descumpriram o dever de organizar e manter os serviços oficiais de estatística nacional. Marco Aurélio argumenta que a suspensão do Censo fere o artigo 21, inciso XV, da Constituição e “ameaçam a própria força normativa da Lei Maior”. A determinação foi enviada ao Plenário virtual para que os demais ministros analisem o caso.