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Campos em busca de uma identidade

Monumentos escolhidos para simbolizar a cidade até hoje não têm a simpatia do campista, mas o “Trevo do Índio” pode ganhar um novo protagonista

Geral
Por Thiago Gomes
5 de abril de 2021 - 0h01
Monumento foi inaugurado no dia 28 de março (Foto: Carlos Grevi)

Primeiro veio o índio goitacá, que, de goitacá, não tinha traço algum. Depois foi a bomba de vareta de sucção, mais conhecida como “bomba cabeça de cavalo”, usada para retirar petróleo da terra. O detalhe é que a atividade petrolífera local sempre foi toda realizada em alto mar. E, por último, inaugurado no dia 28 de março, o letreiro “Eu amo Campos”, que também não imprime qualquer identidade do município. Os três monumentos foram, ao longo das últimas décadas, instalados na entrada da cidade, mas, ufanismo à parte, nunca representaram o orgulho do campista, conforme destacam especialistas em história da Planície.

A historiadora Graziela Escocard acredita que Campos precisa de um marco verdadeiramente representativo. “O antigo índio não era um monumento. Seu material era de alegoria carnavalesca (isopor e fibra de vidro). Ou seja, ele não foi projetado para durar muito tempo, ao contrário do que pensamos acerca de um monumento. Sem falar que a escultura não representa a identidade das características físicas do nosso índio goitacá descritas pelos viajantes”, pontuou a historiadora.

A polêmica estátua do índio foi abandonada no Arquivo Municipal (Foto: Reprodução)

O também historiador e presidente do Instituto Histórico e Geográfico de Campos dos Goytacazes, Genilson Paes Soares, lembra que a polêmica escultura do índio foi instalada no segundo governo de Anthony Garotinho 1997/98 e teria sido elaborada pelo artista Ludogeli, que trabalhava com alegorias de Carnaval. A peça foi retirada do local em 2006 pelo então prefeito interino Roberto Henriques, que, na época, alegou ter se baseado em um laudo emitido pela Defesa Civil Municipal que condenava a segurança da estrutura. Desde então, a estátua jaz abandonada nos fundos do Arquivo Público de Campos, em Tócos.

Maquinário não representa o tipo de atividade petrolífera local (Foto: Carlos Grevi)

A “bomba cabeça de cavalo”, ainda chamada de “cavalo de pau”, também não agradou pelo mesmo motivo do índio. “Acredito que aquela peça foi instalada no governo Arnaldo Vianna em 2002, mas julgo ser extremamente inapropriada, uma vez que não representa as tradições históricas da cidade e nem a forma como o petróleo é extraído na Bacia de Campos”, disse Genilson. “Acho interessante a ideia de um monumento sobre o petróleo em nossa cidade. Mas precisa ser algo adequado”, reiterou Graziela.

Eu amo Campos
Como diz o ditado, gosto não se discute. Mas fato é que o letreiro novo exclui a palavra “Goytacazes” do nome oficial de Campos. O totem de saudação a quem chega à cidade tem sete metros de largura, foi construído pela Secretaria de Obras, Infraestrutura e Habitação em comemoração aos 186 anos de elevação de vila à categoria de cidade. E, segundo o órgão, é dotado de acessibilidade para facilitar que pessoas com mobilidade reduzida possam subir para fazer fotos junto da inscrição “Eu Amo Campos”. Contudo, atravessar o trânsito pesado da BR-101 para acessá-lo não é tarefa fácil.

“O ‘Eu amo Campos’ é um equipamento de apelo turístico que caiu no gosto do povo brasileiro, mas faltou criatividade na peça instalada, tanto na forma como no material usado. Em junho do ano passado faleceu o designer gráfico americano Milton Glaser, que foi criador do logotipo “I love NY” para o Estado de Nova York. Devido ao uso indiscriminado do logotipo em todo mundo, surgiu a notícia que a Prefeitura da Cidade de Nova York teria contratado um importante escritório de advocacia para processar quem a estivesse utilizando”, analisou Genilson Soares.

Maquete do munimento que ONG quer instalar no Trevo do Índio (Foto: Divulgação)

Índios de volta ao contorno?
Segundo relatos históricos, os integrantes da tribo goitacá possuíam pele mais clara, eram mais altos e corpulentos que os demais índios do litoral do Brasil. Tinham cabelo comprido na parte de trás e raspado no topo da cabeça e não usavam tangas. Levando em conta tais características, a ONG Bem Faz Bem articula a construção de uma cena escultórica e um memorial no mesmo local onde ficava o antigo índio. O projeto já existe, foi assinado pelo artista Mário Lúcio Evangelista, e possui parecer técnico favorável do Instituto Histórico e Geográfico de Campos dos Goytacazes.

Presidente e fundador da Bem Faz Bem, Erivelton Rangel de Almeida conta que a ideia do novo monumento surgiu em 2017 e o grupo vem se articulando e tentando levantar fundos, através de patrocinadores, desde então. A cena escultórica composta por três índios seria reproduzida em resina epóxi, com estrutura de vergalhão. Os personagens (dois índios com arco e flecha nas mães e uma índia com uma criança no colo) mediriam entre 2,5 e 2,6 metros.

“O custo total do memorial é de R$ 121.900. Estamos em busca de parceria para devolver à entrada da cidade o maior símbolo campista, que é o índio goitacá ”, revelou Erivelton.

“O projeto que nos foi apresentado é dotado de apuro estético e antropológico e será de enorme relevância para a educação patrimonial de crianças e adultos da nossa região, assim como objeto de informação para os visitantes, turistas ou passageiros”, afirmou Genilson Soares, do Instituto Histórico e Geográfico.