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“A inquieta – Nina Arueira”

É nome de rua e escola pública, mas poucos conhecem sua história.

A história de Campos está cheia de mulheres importantes e incríveis que marcaram sua época. E a vida e a obra dessas mulheres faz parte da memória que podemos ter acesso por meio da história oral, documentos, iconografias, objetos hoje de pesquisa dos historiadores. Portanto, temos representatividade feminina na nossa história regional, sim! Diferente de demais cidades que renegaram as mulheres a um lugar secundário e quase inexistente, a história de nossas mulheres campistas e seus feitos sempre foram reproduzidas, tendo uma grande importância para a construção de nossa identidade, história e memória.

Foto de Nina Arueira, século XX, década de 30. Acervo do Museu Histórico de Campos dos Goytacazes

Obviamente que a lista de mulheres notáveis da história goytacá e seus feitos e extensa e só aumenta. Porém, algumas dessas importantes figuras fazem parte do imaginário popular campista, com a Nina Arueira — Maria da Conceição Arueira (07/01/1916 – 18/03/1935), filha de Lino Arueira e de sua esposa, Maria Magdalena Rocha e Silva. Desde a infância se mostrou precoce e superdotada. Sua avó chamava-a de “Pequenina”, e os familiares apenas de “Nina”, pseudônimo que viria a adotar na adolescência, se tornando uma jovem jornalista da cidade de Campos dos Goytacazes, militante revolucionária que morreu de febre tifoide antes de casar com Clóvis Tavares e de completar vinte anos.

E qual foi a sua relevância histórica? Porque essa moça bonita e inquieta marcou a história da cidade? Nina teve uma vida curta, porém muito agitada e além de sua época. Seus artigos, publicados na “Folha do Commercio”, poucos, pois o jornal era conservador, e no jornal “A Notícia”, chocando a opinião pública.

“A mulher que espera tudo do casamento — que resume sua vida nisto — é imoral, porque mercadeja oficialmente o seu corpo… a mulher moderna deve ter maiores desejos que desejos de amor: deve ansiar individualmente, força, luta e vitória…” (Nina Arueira, Folha do Commercio, 24/04/1932).

Com 16 anos também publicava artigos em defesa da classe trabalhadora e das prostitutas. Chegou até ser convidada a sair do Liceu de Humanidades por agitação ideológica. Filiou-se ao Partido Comunista com 18 anos e fundou a Aliança Nacional Libertadora em Campos, frente de esquerda composta por setores de diversas organizações de caráter antifascista e anti-integralista.

No entanto, o que fez essa moça ser imortalizada? Após sua morte, em 18 de março de 1935, começa, então, um processo histórico no qual duas correntes — os espíritas (kardecistas) e os comunistas — disputam sua memória e passam a lhe atribuir caraterísticas místicas de heroína e mártir.

Segundo Juliana Carneiro, que escreveu o livro “O Despertar de Nina Arueira: da disputa de memória à construção do mito”, para os comunistas, morreu uma aguerrida militante, uma referência de luta para mobilizar novos militantes. Já para os espíritas, Nina não morreu! Apenas desencarnou. Deixou de lutar pelas injustiças terrenas e evoluiu ao ponto de contribuir com a humanidade de forma espiritual.

Profundamente abalado pela morte da noiva, Clóvis Tavares recebeu a notícia de que o espírito de Nina havia se comunicado numa sociedade espírita. Esse fato deu novo alento à vida de Clóvis que, a partir de então, torna-se adepto da doutrina espírita e, pouco depois, em outubro de 1935, cria um educandário inspirado numa escola do plano espiritual fundada pelo espírito Nina.

Entre os médiuns que psicografaram as mensagens do espírito Nina, que nortearão os trabalhos de Clóvis, destaca-se Francisco Cândido Xavier. Desde então foram fundadas casas espíritas e grupos assistenciais com o nome de Nina Arueira.

O que aprendemos com ela? Através dos escritos desta mulher percebemos como ela imprimiu sentido à sua existência. Chegamos a acompanhar sua trajetória e o amadurecimento de seus ideais que eram explícitos em seus textos, como sua opção de vida, suas dúvidas, suas angústias e, sobretudo, suas propostas para o que chamava de “um mundo melhor”.

“A mulher que reconhece sua qualidade de ser humano; racional, sensível, vibrante, com os mesmos direitos à vida e à liberdade. É a mulher que se julga capaz de enfrentar todas as lutas…” (Mensagem psicografada, Nina Arueira, 29/04/1942).

Graziela Escocard – Historiadora
Instagram: @grazi.escocard
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