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De Rosinha para Rafael e agora para Wladimir

Entra governo e sai governo, problemas estruturais não resolvidos da cidade são transferidos a cada 4 anos para o próximo prefeito

Campos
Por Marcos Curvello
27 de dezembro de 2020 - 0h01

Wladimir Garotinho (Foto: Carlos Grevi)

No dia 25 de dezembro de 2016, em sua 15ª edição, o Jornal Terceira publicou um breve inventário dos problemas herdados da gestão Rosinha Garotinho pelo então prefeito eleito de Campos, Rafael Diniz. Um sistema público de transporte criticado pela população, uma saúde envolta em uma rotina de denúncias de falta de insumos e medicamentos básicos e uma cidade com sérios problemas de infraestrutura eram os principais elementos do que foi avaliado, à época, como um verdadeiro presente grego. A poucos dias do fim do mandato, Rafael afirma que entrega a Wladimir Garotinho uma cidade mais organizada do que recebeu. Mas, quatro anos depois, os gargalos a serem superados permanecem os mesmos.

Questões como orçamento, transporte, funcionalismo, desenvolvimento humano e social, saúde, educação e infraestrutura devem mobilizar os esforços de Wladimir e de seu secretariado já a partir do dia 1º de janeiro. Entre novas e velhas queixas da população, os problemas continuam muitos e se devem tanto a decisões e falhas administrativas do governo quanto a circunstâncias que estão para além da política municipal, mas que impõem desafios adicionais à Prefeitura. Há, também, dificuldades crônicas, que Campos parece resistir a superar.

Orçamento
Com uma previsão orçamentária de R$ 1,7 bilhão para 2021, a situação fiscal da Prefeitura de Campos exigirá dedicação na busca por recursos junto às esferas Estadual e Federal. Isso porque a conta não fecha. Somente com a folha de pagamento do funcionalismo, o governo Rafael Diniz deixa um compromisso de R$ 1,1 bilhão.

Além do pagamento do funcionalismo, a Prefeitura tem outras obrigações financeiras. Manutenção de serviços básicos, como limpeza urbana e hospitais contratualizados, pagamento de fornecedores e convênios, custeio de instalações e políticas públicas são apenas algumas das despesas que compõem o orçamento Municipal.

Não bastasse o volume de compromissos, o Município pode enfrentar frustração de receitas da ordem de até 12%, já que a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), aprovada em julho pela Câmara e sancionada em agosto pelo prefeito Rafael Diniz (CDN), é baseada em planejamento feito entre fevereiro e março, antes da pandemia do novo coronavírus.

Enfrentando reduções sucessivas na arrecadação proveniente da exploração do petróleo, incluindo duas inéditas participações especiais zeradas, Campos ainda precisa lidar com a queda de arrecadação causada pelos reflexos da emergência sanitária da Covid-19 sobre os setores produtivos do Município, que resultou no fechamento de diversas lojas nos últimos meses.

Transporte
Alvo consistente de reclamações e protestos ao longo dos anos e governos, a mobilidade deverá se mostrar uma das principais preocupações do próximo governo, na medida em que dela depende tanto a qualidade de vida da população quanto a saúde da economia local, especialmente do comércio de bens e da prestação de serviços.

O histórico do transporte público nos últimos anos inclui incontáveis protestos contra a falta de ônibus em distritos e localidades, bloqueio de vias e até incêndio a coletivos. Mas não são apenas os usuários que reclamam. Os empresários do setor veem concorrência desleal nas vans e no transporte alternativo. Enquanto isso, os governos expressaram, em diversos momentos, insatisfação com os serviços prestados pelas empresas, em um raro caso de unanimidade, no caso má, avaliação de um serviço no município.

Para tentar pacificar a situação, o governo Rafael Diniz implantou em Campos o transporte alimentador de passageiros. O novo sistema redefiniu a cobertura do município para evitar a concorrência entre vans e micro-ônibus, que passaram a atender distritos e localidades, e ônibus, que circulam pela região central. Terminais de integração conectam ambos modais e a tarifa é única, regulada por bilhetagem eletrônica.

Embora seja semelhante ao operado em outras cidades do país e do estado, como Curitiba, Rio de Janeiro, Niterói e Macaé, o novo sistema não foi suficiente para encerrar as queixas sobre o transporte público. Passageiros se queixam da precariedade dos terminais de integração improvisados pela Prefeitura, da falta de acesso direto ao Centro e da longa espera por ônibus em bairros e localidades distantes.

(Carlos Grevi)

Funcionalismo
O tamanho da folha, contudo, pode não ser o único compromisso financeiro de Wladimir com os servidores. Resta quitar os salários de dezembro e o 13º salário. A gratificação natalina começou a ser paga nesta quinta-feira, mas apenas profissionais da Educação, que são pagos com verba destinada pelo Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb), receberam integralmente. Servidores lotados em outras pastas receberam apenas 25% do abono e aposentados e pensionistas, 40% .

O subsídio natalino, inclusive, é objeto de duas ações na Justiça, movidas pelo Sindicato dos Profissionais Servidores Públicos Municipais de Campos (Siprosep) e pelo Sindicato Estadual dos Profissionais da Educação (Sepe).

Adicionalmente, o prefeito eleito poderá ter que colocar em dia os pagamentos de aposentados e pensionistas, que vêm recebendo de forma parcelada nos últimos meses. Atrasos no cronograma dos beneficiários do Instituto de Previdência dos Servidores Públicos de Campos (PreviCampos) levaram a professora aposentada Lourdes Julião Soares, de 56 anos, a protestar em frente à sede do órgão, em novembro. “Sou servidora e mereço respeito”, dizia um cartaz, empunhado pela educadora.

Fica em aberto, também, a situação de prestadores de serviço remunerados por Recibo de Pagamento Autônomo (RPA), que relatam atrasos variados de pagamento. Em alguns casos, representantes da categoria chegaram a reivindicar, ao longo do ano, a quitação de vencimentos relativos a até seis meses de trabalho.

Desenvolvimento humano e social
Campos é um município com Produto Interno Bruto (PIB) per capita de R$ 35.475,94, segundo dados de 2016 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), onde 45 mil famílias vivem em situação de extrema pobreza, com renda de zero a R$ 89 por mês, de acordo com a Secretaria do Desenvolvimento Social do Ministério da Cidadania.

Desde o início da pandemia, 700 lojas fecharam as portas no Município, o que resultou na perda de 2,1 mil postos de trabalho, afirma a Câmara de Dirigentes Lojistas (CDL) de Campos.

O restante do setor se manteve em função do Auxílio Emergencial do Governo Federal, criado para amparar trabalhadores informais, microempreendedores e contribuintes individuais e desempregados durante a emergência sanitária da Covid-19. Mas a União não confirma a extensão do benefício em 2021.

A vulnerabilidade de parte da sociedade campista pode ser percebida pelo crescimento da informalidade e da população de rua. Agrava a situação a suspensão, pelo Governo Municipal, em 2017, de programas sociais e iniciativas como o Cheque Cidadão, a passagem a R$ 1 e o restaurante popular em decorrência da queda de arrecadação com a crise mundial do petróleo.

Saúde
A pandemia do novo coronavírus coloca sobre a Saúde uma pressão ainda maior do que a pasta, historicamente problemática, teria em qualquer outro governo. Além de continuar a gerir o atendimento aos pacientes da Covid-19 em um momento em que a curva de casos volta a subir, Wladimir tentará ter sucesso onde seus antecessores não conseguiram, para sanar problemas crônicos da rede pública municipal.

Entre os desafios estão: manter o abastecimento contínuo de remédios e insumos básicos; recuperar a estrutura física de unidades de saúde como os Hospitais Ferreira Machado (HFM) e Geral de Guarus (HGG); regularizar os repasses à rede contratualizada, que atende à população pelo Sistema Único de Saúde (SUS); equipar Unidades Básicas de Saúde (UBSs); estruturar a Estratégia Saúde da Família (ESF), antigo Programa Saúde da Família (PSF); e ampliar o alcance da rede básica.

(Foto: Carlos Grevi)

Educação
A rede pública municipal de ensino de Campos possui, segundo a secretaria de Educação, cerca de 54 mil alunos e aproximadamente cinco mil professores. Esses profissionais atuam em 236 unidades escolares, sendo 155 escolas e 81 creches, todas fechadas em função da pandemia.

A próxima gestão assume com o compromisso de tornar possível a retomada do processo educacional, interrompido pelo novo coronavírus, independente da imunização da população. Ou seja, permitir que o ensino volte a acontecer ao mesmo tempo em que respeita as medidas sanitárias que vêm orientando as relações sociais desde o início da pandemia.

Trata-se de uma necessidade especialmente desafiadora, na medida em que é preciso, ao mesmo tempo, atuar pela melhoria do desempenho escolar dos alunos e pela correção de falhas administrativas. Em 2019, a performance da rede municipal de ensino no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) não foi das melhores, mas, em 2020, por uma falha humana, a nota de Campos no Ideb não foi computada. Foi a primeira vez que isso aconteceu em 15 anos.

(Carlos Grevi)

Infraestrutura
Campos, que teve o sétimo maior PIB do Brasil em 2013 e é até hoje o segundo maior do Rio de Janeiro, possui 100% de atendimento urbano de água e 90% de atendimento urbano de esgoto. Mas, vem perdendo posições no Ranking do Saneamento Básico do Instituto Trata Brasil, devido aos inúmeros distritos em área rural. Passou da 34ª posição, em 2018, para a 47ª, este ano. No Estado, fica atrás de Niterói (18ª) e Petrópolis (20ª).

Mas, é na temporada de chuvas que os transtornos se tornam mais visíveis, com alagamentos na região central e cheias dos rios Paraíba, Muriaé e Ururaí, que eventualmente rompem diques e causam cheias e enchentes, deixando desabrigados e desalojados em comunidades ribeirinhas, como as localidades de Três Vendas e Ururaí, por exemplo.

Outra reclamação comum a respeito da infraestrutura diz respeito à malha viária do Município. As operações tapa buracos promovidas pela Prefeitura não conseguem acompanhar a velocidade da deterioração das vias, castigadas pela circulação, em perímetro urbano, de caminhões de todos os portes, de passagem pelas BRs 101, que traz para dentro da cidade o tráfego com destino tanto à capital quanto ao Espírito Santo, e 356, acesso à Região Noroeste Fluminense e ao Porto do Açu.

Há, ainda, obras a finalizar, como o novo Shopping Popular Michel Haddad, a expectativa por melhoria dos serviços de coleta de lixo e paisagismo e a preservação da capacidade de funcionamento de equipamentos culturais, como o Museu Histórico de Campos e do Teatro Municipal Trianon, que chegaram a ter a luz cortada por duas vezes devido à falta de pagamento em 2020.