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O dano colateral das pesquisas eleitorais

Com frequência o eleitor abre mão de 'seu' candidato para votar naqueles que os institutos apontam como favoritos

Guilherme Belido Escreve
Por Guilherme Belido
11 de outubro de 2020 - 0h01

Com o título ‘O voto por Campos’, matéria de domingo passado buscou conectar a crise financeira ora vivida pelo município – fruto da costumeira má utilização dos royalties e das recentes quedas de receita – com a responsabilidade que o momento exige de cada um na hora de votar. Trouxe, ainda, observações do juiz Ralph Manhães sobre o processo eleitoral em tempos de pandemia e do empenho para que o pleito de 15 de novembro transcorra de forma pacífica e ordeira.

Agora, a partir do Horário Eleitoral Gratuito iniciado na sexta-feira passada (09), cabe enfatizar a oportunidade que tem o eleitor de conhecer os candidatos, de comparar suas ideias e de analisar se o que dizem, projetam e prometem afiguram-se, de fato, viáveis de serem postos em prática.

De certo, considerando o período eleitoral de ‘mangas curtas’, com distanciamento social e sem aglomerações – restrições rigorosamente necessárias para conter a proliferação do vírus – é a propaganda gratuita o canal mais próximo e seguro entre candidato e eleitor.

Redes sociais
Como vem ocorrendo nas últimas eleições, os conteúdos impulsionados nas redes sociais detêm grande fatia entre todas as plataformas usadas pelos candidatos no intuito de convencer o eleitor.

Entretanto, a despeito da gigantesca abrangência e velocidade da informação, as tão discutidas e combatidas fake news – a disseminação deliberada de notícias falsas e boatos, onde do ‘escurinho’ do anonimato brotam ataques, ofensas e conteúdos deformados e odiosos – acabaram em grande parte por comprometer a eficácia dessa modalidade.

Assim, apesar de sua amplitude, as redes sociais se transformaram na ferramenta de menor credibilidade entre todas as formas de comunicação. A consequência é que diante do volume de fake News, até a notícia verdadeira é posta em xeque pela desconfiança generalizada acerca do que é postado.

As pesquisas

Debatidas, questionadas e contestadas – ora acertando nas projeções, ora errando ‘barbaridade’ – fato é que as pesquisas eleitorais se transformaram em engrenagem indissociável das campanhas e coberturas jornalísticas.

Não por acaso, são encomendadas, em sua maioria, por grupos de comunicação – jornais, emissoras de televisão, portais de notícias, revistas, sites, etc – que a partir dos dados levantados auxiliam nas análises dos profissionais de imprensa – da mídia em geral.

Das pesquisas se valem, também, os partidos políticos, que com os percentuais apurados avaliam o desempenho das campanhas de seus respectivos candidatos.

Cautela – Entretanto, tudo deve ser visto com certa reserva. Primeiro, porque os próprios institutos ressalvam que pesquisa fotografa o momento da consulta – o que não deixa de ser um escudo, espécie de ‘cautelar’ que preventivamente justifica eventuais erros. Segundo, porque uma vez admitidos os erros e surpresas, a captação e divulgação da intenção de votos passa a ser algo instável e movediço.

De mais a mais, há que se levar em conta que – como fartamente sabido – se grande parte do eleitorado decide o voto nos últimos dias, não raro na véspera, os dados colhidos antecipadamente engrossam a fila do incerto.

Erros – Para não ir longe no tempo nem distante na geografia, a votação obtida em 2018 pelo ora governador afastado do Rio de Janeiro, Wilson Witzel, é didática ao que se observa: Ibope e Datafolha lhe davam em torno de 2% a 3%, mas o ex-juiz federal alcançou 42,7% – mais que o dobro do ex-prefeito Eduardo Paes, que somou 19,56%.

Outro resultado que contrariou frontalmente as pesquisas foi a votação de Dilma Rousseff para o Senado por MG, também em 2018: até a véspera apontada como favorita pelos mesmos institutos, acabou na quarta posição.

Entre outros exemplos que expuseram a fragilidade das pesquisas no pleito de 2018, também para o governo de Minas, Ibope e Datafolha erraram feio. Os institutos davam liderança folgada para Antonio Anastasia, seguido por Fernando Pimentel. Mas quem chegou na frente para o 2º turno foi Romeu Zema, com folgados 43%.

Erros à parte – não poucos – há que se dar às pesquisas seu valor. Contudo, o eleitor deve estar atento ao lado nocivo desses levantamentos que podem induzir a erro e, por fim, tirar de ‘sua cabeça’ o candidato que tinha como preferido.

Mais justo – É possível que no futuro a Justiça Eleitoral restrinja as pesquisas ao consumo interno – apenas para partidos e candidatos – impedindo que a informação chegue ao eleitor, o que contribuiria para um processo mais justo. Mas esse é assunto para outra matéria.

O lado pernicioso de se apontar os que estão à frente

MARINA SILVA | Apenas 1% no pleito de 2018. A candidata possivelmente foi
prejudicada pelos números antecipados das pesquisas

Espetacular instrumento de informação para candidatos e partidos, as pesquisas eleitorais passaram a ser mecanismo quase obrigatório de aferimento do desempenho do postulante junto ao eleitorado.

Contudo, como costumava dizer o saudoso Leonel Brizola… “(…)Para que eleição? Para que votar? A gente empossa quem a pesquisa disser que está na frente e acaba logo com isso…” – reclamava o velho caudilho, com aquele jeitão gaúcho, da ditadura advinda das pesquisas.

De certo, o ex-governador do Rio Grande do Sul e do Rio de Janeiro, um dos nomes mais importantes da história política brasileira, tinha razão: muitas vezes as pesquisas retiram do processo de escolha o voto genuíno.

Em outras palavras, se o eleitor, influenciado pelas pesquisas, deduz que seu candidato preferido não tem chances de vencer, migra para outro postulante melhor colocado. Trata-se de um fenômeno simples e corriqueiro: votar em quem ‘já perdeu’ deixa a sensação de que o voto foi desperdiçado.

O exemplo Marina Silva – A circunstância acima ficou clara no último pleito para presidente da República. Vejamos: a candidata Marina Silva, que em 2014 chegou a ficar à frente de Dilma e Aécio e, mesmo recuando, por pouco não foi para o 2º turno, quatro anos depois despencou ladeira abaixo: oitavo lugar, apenas 1% dos votos: 1 069 578.

Ora, estamos a falar da eleição de 7 de outubro de 2018, na qual Bolsonaro obteve 49 milhões de votos e Haddad 31 milhões. Terá – pergunta-se – a candidata da Rede caído tanto no conceito do eleitor a ponto de lhe ‘sobrar’ somente 1% ou – como afigura-se lógico –, foram as pesquisas que interferiram numa fatia de seus simpatizantes os quais, desanimados com os pífios números divulgados pelos institutos, resolveram ‘pular’ na direção dos favoritos? Em suma, não votaram em quem gostariam, mas nos que aparentavam chances de vitória.

Dano colateral – De resto, cabe inferir que a formidável e irreversível ferramenta produz, ainda, o indesejável voto útil, ou voto tático, o qual, da mesma forma, afasta o voto intuitivo – o da ‘primeira hora’ – levando o eleitor, como dito acima, a desistir de “seu” candidato e escolher o postulante “x” por ser, ante o que se lhe apresenta, menos ruim que o “y”.

Enfim, é uma distorção que precisa ser corrigida.