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“Apresento propostas e não promessas”

Ex-vereadora, Odisséia Pinto de Carvalho, vai disputar à prefeitura pelo PT e propõe a criação de uma moeda social de circulação

Entrevista
Por Aloysio Balbi
4 de outubro de 2020 - 0h02

Odisséia é candidata pelo PT (Foto: Carlos Grevi)

Ao mesmo tempo em que o PT para muitos perdeu prestígio, o prestígio dela dentro do partido que governou o país por quase 16 anos ininterruptos continua intocável. A pedagoga Odisséia Pinto de Carvalho, vereadora em Campos de 2009 a 2012, é candidata do partido à Prefeitura de Campos.

Além de vereadora, ela foi coordenadora da Regional de Educação do Norte Fluminense – Campos, São João da Barra e São Francisco de Itabapoana – comandando 195 escolas; assessora especial da ministra Nilcéia Freire, da Secretaria Especial de Política para Mulheres e membro do Conselho Nacional dos Direitos da Mulher.

Entra na campanha com a proposta de costurar o tecido social e remendar a rede de proteção aos mais humildes. Centra seu discurso na Saúde, Educação, Transporte e Agricultura. Lamenta que Campos, em sequentes administrações, tenha deixado esvair dinheiro e oportunidades. Sobre o orçamento minguado, ela não concorda com a afirmação de que é pouco dinheiro. “É possível fazer muito com isso se for utilizado de forma racional e técnica”.

Odisséia se inspira na administração do PT em Maricá, no litoral da região metropolitana do Rio, onde foi criada uma moeda local como forma de evitar a sangria de dinheiro para outras praças e valorizar o comércio. Da mesma cidade, ela quer tentar resolver parte dos problemas do transporte coletivo, colocando imediatamente 13 ônibus “vermelhinhos” para fazer linhas circulares, priorizando Guarus com passagens grátis. Perguntada se seria possível lançar uma moeda interna para Campos, cidade bem maior que Maricá, ela se socorre ao exemplo bem sucedido de Niterói. Por fim, perguntada se em Odisséia Carvalho ainda vive uma esperança, ela pedagogicamente diz que sim, e que sonha com uma estrela a brilhar.

Caso você seja eleita, como pensa equacionar os múltiplos problemas do município de Campos, onde eles sobram e o dinheiro falta?
São muitos os problemas e o dinheiro não é o ideal, mas Campos ainda tem um orçamento, algo em torno de R$ 1,6 bilhões que se compara a orçamentos de algumas capitais do país de porte semelhante ao município de Campos. Então não é uma migalha. Se bem aplicado, com responsabilidade e prioridades, será possível fazer com que a população viva com cidadania e dignidade. O foco sempre será a população. Ela hoje está desprovida de insumos básicos e com uma rede de proteção social cheia de furos. Mesmo com esse orçamento e tentando aumentá-lo com receitas próprias, é possível fazer muito por Campos.

Candidata a prefeitura de Campos em 2020 (Foto: Carlos Grevi)

Você falou em furos na rede social. Parece que com o passar do tempo, mais gente ficou mais pobre e saiu da zona de vulnerabilidade social para a extrema pobreza. Isso é fato?
Para você ter uma ideia, o auxílio emergencial na pandemia em Campos oficialmente atendeu a 45 mil, número próximo do que atendia o bolsa família. Houve um empobrecimento sim das famílias. Agora pense se os 24 bilhões de royalties do petróleo recebidos ao longo dos últimos 25 anos fossem aplicados de forma criteriosa. Não é necessária fazer muita conta. É, indiscutivelmente, dinheiro suficiente para tirar todos da miséria, não com programas sociais, mas sim usando esse dinheiro para gerar mais renda, emprego e desta forma teríamos varrido a miséria de vez. O que houve aqui nos últimos anos foi a tentativa de varrer a miséria para debaixo no tapete.

Então essas 45 mil pessoas que viviam em uma insegurança social estão agora rumo à pobreza extrema?
Destino infeliz. Tudo caminha neste sentido. Por isso cada centavo do orçamento terá que ser bem aplicado. Esse é um problema de seguidas administrações e que se intensifica agora com a pandemia.

Um dos seus projetos é criar uma moeda para Campos, com circulação interna. É fato?
Sim. Como foi feito em Maricá, no litoral da Região Metropolitana do Rio e teve como objetivo proteger a população, os pequenos e micro comerciantes e empreendedores. Em Maricá, administrada pelo PT, foi criada a Mombuca, uma moeda que só pode ser gasta no município. Com isso, no mínimo se evita a sangria de boa parte do dinheiro convencional que circula na cidade para outros municípios.

Maricá é uma cidade bem pequena se comparada a Campos. Você acha ser possível criar algo similar aqui?
Lógico que sim. Extremamente viável. A cidade de Niterói que se assemelha bastante a Campos em população e demandas criou e funcionou. Meu plano é criar. O comércio vai adorar poder ter certeza disso. Como disse anteriormente isso vai impedir essa sangria de dinheiro para outras praças. As pessoas têm um olhar cético sobre isso, por uma questão cultural, mas os economistas sabem que funciona.

Algum projeto para a área central de Campos?
Temos que tratar o centro como um organismo vivo. Nele transitam diariamente milhares de pessoas. Nele estão concentrados os principais órgãos oficiais, agências bancárias e prestadores de serviços, além do comércio, é claro. Isso sem falar de pessoas que moram no Centro. Mas quando se fala em Centro logo você me arremete ao comércio local, que tem que ser valorizado. Então volto a falar na moeda social usada hoje em Maricá. Para se ter uma ideia, essa moeda social vai inibir a venda on-line. Mas, obviamente, temos projetos para o Centro da cidade, com uma verdadeira revitalização. Vamos tornar o Centro funcional, atrativo e belo. O Centro de Campos é bonito, mas foi ficando desfigurado com uma sequência de obras equivocadas sem nenhuma harmonia entre si.

Essa moeda social é um indicativo de que os programas sociais vão ganhar musculatura em caso de vitória da sua candidatura?
Lógico e ela é uma das muitas ferramentas para tratarmos disso. É possível até, com força política, fazer cortes na máquina e ter mais dinheiro em caixa para projetos sociais e outros custeios. O problema da folha de pagamento pode ser resolvido fazendo uma revisão de cargos comissionados, DAS, RPAs, terceirizados, entre outros custos. O servidor concursado irá cumprir o seu papel nos seus respectivos cargos. É possível fazer uma grande economia aí, e temos que fazer.

E quanto aos servidores aposentados e pensionistas?
Estão com os salários atrasados ou picados, por conta de uma operação estranha na Previcampos. Todos sabem o que realmente aconteceu. Quebraram a previdência dos servidores, aplicando R$ 500 milhões em um banco conhecido como Cruzeiro do Sul. Esse dinheiro tinha que ser aplicado em bancos oficiais e não em um banco de atacado que os servidores aposentados nem sabem onde fica sua sede. Esse dinheiro tem que voltar para os cofres da prefeitura. Quando eu era vereadora, eu denunciei no plenário a aplicação indevida deste dinheiro no Cruzeiro do Sul.

E a Saúde?
Esse é outro problema muito sério de Campos e que atinge, obviamente, os mais pobres. Pretendemos retomar a Saúde Preventiva, com o Programa Saúde da Família. A pandemia fez com que fossem desativadas paradoxalmente várias Unidades Básicas de Saúde. Temos um projeto que pretendemos realizar em parceria com a Faculdade de Medicina de Campos, com o curso de farmácia e a Universidade Federal Fluminense – UFF- na área de serviço social. Soma-se a isso a reestruturação dos hospitais, como por exemplo o HGG que mais se assemelha a escombros de uma guerra. A Saúde será um desafio constante e é peça importante neste contexto da rede de proteção social.

Algum desconforto em ser candidata pelo PT?
Muito pelo contrário. Tenho orgulho. Orgulho por tudo que o PT fez pelo país, inclusive por Campos. Para Campos, nos governos do PT foram liberados R$ 15 milhões para a construção de creches. O chamado Mais Educação foram R$ 14 milhões. Outros R$ 5 milhões para alimentação escolar e 21 ônibus escolares. Isso sem falar no Instituto Federal Fluminense, que inclusive foi inaugurado presencialmente pelo então presidente Lula que esteve em Guarus. Na Saúde, o governo Lula liberou R$ 300 milhões em repasses para Campos e 90 mil pessoas receberam remédios de graça e 28 profissionais cubanos passaram a atender em unidades de saúde no programa Mais Médicos.

E essa polarização em âmbito nacional?
Temos lado. Nosso lado é ao lado do povo. A gente quer uma sociedade mais justa, mais igualitária. Para isso, a gente quer o orçamento participativo. Discutir com as associações, para que as pessoas passem a se considerar pertencentes daquilo que é delas. Acho que essa questão nacional, nos moldes do confronto, não terá reflexos nas eleições.

Caso você seja eleita, como será a relação com os governos Federal e Estadual?
Reconheço que será uma tarefa difícil. Mas preconizamos uma relação republicana. Minha proposta é a criação de consórcios dos municípios por regiões, para interagir com o Planalto e o Guanabara em bloco. Temos que fazer um consórcio dos municípios, despersonalizando essa coisa da política partidária. A pauta de reivindicações seria feita em bloco e, assim, quebrar qualquer tipo de argumento político. Ao mesmo tempo, os municípios da região se aproximariam cada vez mais e isso seria uma experiência muito interessante no cenário da política e da administração regional.

Transporte também é outro problemão em Campos?
Exatamente. E o primeiro passo para tentar resolvê-lo, será inspirado no que o PT está fazendo em Maricá. De início, vamos colocar 13 ônibus de graça, em regime circular, privilegiando Guarus, onde moram 150 mil pessoas. Hoje, o transporte coletivo em Campos é ciático. As experiências, mesmo que bem intencionadas, não deram certo. Em Maricá são os ônibus “vermelhinhos”. Essa tentativa de integração foi um desastre, que resultou em filas e filas. Também vamos cuidar e ampliar a malha de ciclovias. Moramos em uma planície onde o ciclismo é um transporte acertado em todos os sentidos. Mas é preciso segurança. Temos que ter boas ciclovias e bicicletários para que as pessoas possam deixam suas bicicletas em segurança. Parece pouco, mas não é. Isso solucionaria uma boa parte do problema, como já está acontecendo em cidades maiores do que Campos.

Algum projeto para a Agricultura?
Defendo que a Agricultura é uma vocação nata do nosso município e que foi abandonada. Neste primeiro momento, não dá para falar em agronegócios nos moldes do Norte do país. Temos que investir nos pequenos agricultores, na economia solidária, com as cooperativas. Por lei, 30% da merenda escolar têm que ser comprada dos pequenos produtores do município. Você pode fazer a compra antecipada. Não temos um ambiente por enquanto para sonhar, repito, com uma Agricultura de cinema, mas temos terras e gente disposta a trabalhar. Não faltará incentivo para esses pequenos agricultores.

Odisséia de Carvalho é pedagoga (Foto: Arquivo)

Fale um pouco de Educação.
Essa é minha área. Posso adiantar que a prioridade, que vai beneficiar os professores e outros servidores é a revisão do plano de carreira. Também vamos construir mais creches. Reformar as escolas que já existem e, em parceria com as universidades, faremos um censo educacional que irá nortear toda a nossa política de Educação. Queremos pelo menos cinco escolas de tempo integral e cursos profissionalizantes em parceria com o IFF e escolas da rede Faetec.

Para a Cultura?
Campos viveu os últimos anos sem biblioteca pública. Temos que ter mais de uma biblioteca pública. Temos que ter bibliotecas nas escolas. Temos que ter um museu decente. O Arquivo Municipal tem que ter seu conteúdo digitalizado e apresentei projeto neste sentido quando vereadora. É extremamente necessário o apoio a cultura popular, principalmente aos artistas de Campos. Meu vice está trabalhando nesta área.

Fale do seu vice.
Moaldenir é um militante histórico do Partido dos Trabalhadores, petroleiro, ligado à cultura, à arte. Ele é da Lyra de Apollo, tem todo um histórico na luta em defesa da Petrobras, essa riqueza que está sendo fatiada e vendida. Então, é uma honra tê-lo na nossa chapa. É uma pessoa de luta e de resistência. Extremamente culta e ligada às coisas da cultura.

Em você ainda brilha uma esperança?
Enquanto estiver vida, há esperança. Nessas eleições, vamos avançar. Vai ser uma eleição diferente. Vamos apresentar propostas e não promessas.