Performance | o grupo vai poder ver suas experiências em livros.
(Fotos: Divulgação)
“O teatro que nasce nas escolas públicas da periferia tem fertilizado a cena da cidade, apesar de ser um tanto marginalizado enquanto forma artística. Falamos a partir de nosso chão, daquilo que nos dá substância. E acredito que um dos maiores desafios do teatro contemporâneo seja assumir o compromisso de reunir uma pluralidade de perspectivas sobre nosso país”. A fala cheia de orgulho é da professora, atriz e diretora teatral Luiza Rangel. E não é para menos, afinal, o espetáculo teatral “Fale sobre mim”, implantado por ela na rede municipal carioca, vai fazer parte de um livro didático em 2021.
A Editora Moderna vai registrar o trabalho em um capítulo do livro de Artes do Ensino Médio, que será distribuído na rede pública de todo o Brasil, incluindo trechos da dramaturgia e as imagens. Luiza é campista e o “Fale sobre mim” foi idealizado por ela no ano passado. No palco, seus alunos dão vida a personagens com histórias reais sobre suas vivências e memórias. Os atores são, em sua maioria, moradores de áreas de conflito social na periferia do Rio.
Luiza conta que a última apresentação do espetáculo foi em dezembro do ano passado, no Palcão da Unirio, no bairro da Urca, no Rio. Segundo ela, a repercussão surpreendeu. Porém, com a pandemia, as expectativas para apresentações, este ano, foram abrandadas. Mas, a vida deu um jeito de surpreender a todos do elenco. “Este ano, a convite da revista Questão de Crítica, escrevi um artigo falando sobre o processo de criação, que está disponível online no site da revista. E, mais recentemente, recebemos o contato da Editora Moderna, com interesse em mencionar nosso espetáculo no livro didático do Ensino Médio, no Capítulo sobre Teatro Documentário”, esclarece.
Professora Luiza Rangel | percebeu o potencial das histórias dos estudantes e levou os seus relatos para o teatro.
Ela explica que foi uma alegria para todo o grupo saber que as narrativas contidas no espetáculo vão circular pelas salas de aula do Brasil. “Apesar de termos suspendido nossos encontros em março de 2020, em virtude da pandemia, ainda pulsa em nós o desejo de perfurar a cena teatral com nossos símbolos cotidianos, inaugurando outros modos de ver o mundo. Para mim, a criação tem a ver com tudo isso, com autoralidade e resistência. Salve o Teatro!” acredita Luiza.
Início
Luiza é professora de Artes Cênicas em uma escola pública localizada em Paciência, periferia da Zona Oeste do Rio, e o “Fale Sobre Mim” nasceu quando um grupo de alunos do sexto ano começou a se interessar por teatro, mesmo após o término das aulas. Esses estudantes sempre procuravam a professora para orientar alguma cena, desenvolver ideias e no meio disso acabavam relatando um pouco de suas trajetórias de vida, seus desejos e sonhos. A partir daí Luiza percebeu, nesses adolescentes, vivências fortes e uma incrível capacidade de ressignificá-las poeticamente. “Ao escutar relatos tão potentes, me senti convocada, comecei a perceber que a juventude tinha sede em ver suas narrativas representadas ali, no teatro”, resume.
A primeira cena do “Fale Sobre Mim” foi criada em 2018, quando o grupo participou do Festival de Teatro de Alunos da Rede (Festa) apresentado no Teatro Ipanema. De lá pra cá não pararam mais. As pesquisas têm como foco as narrativas autobiográficas, o olhar para a escola, a cidade e a experiência da adolescência. Os integrantes do grupo levam para o palco suas experiências de vida. “Essa pesquisa sobre auto-ficção com estudantes de escola pública é, inclusive, meu atual objeto de estudo no Mestrado do Programa de Pós-Graduação em Ensino de Artes Cênicas da Unirio, sob orientação da professora Rosyane Trotta. Hoje, a peça tem 50 minutos de duração. Dos nove alunos que já passaram pela pesquisa, cinco ainda estão no elenco: Maria Paula; Wilson Ruan; Brenda Laura; Analya Britney e Lucas Reis. Pelo jeito, o grupo ainda vai ter muita história para contar.
