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Sem perspectiva de retorno breve, setores mais afetados se preparam para mudanças

Áreas como turismo, entretenimento, alimentação, atividade física e beleza arriscam projeções

Economia
Por Redação
17 de maio de 2020 - 0h01

Por Mariane Pessanha, Ocinei Trindade, Ulli Marques, Priscilla Alves, Bernardo Rust

Desde que a pandemia do novo coronavírus se espalhou pelo mundo, quase todos os setores da economia paralisaram suas atividades, parcial ou totalmente. É um período de enfrentamentos à doença Covid-19, além das dificuldades financeiras que acometem grande parte da população do planeta. Em Campos, os reflexos da crise sanitária, do desemprego e da falta de dinheiro para suprir necessidades básicas podem ser conferidos nas filas de agências bancárias ou nos depoimentos de pessoas que se manifestam em redes sociais.

A equipe de reportagem do Jornal Terceira Via se dividiu para ouvir trabalhadores e empreendedores de diferentes segmentos. Eles relatam a realidade que vivem neste período de quarentena e distanciamento social.  Com seus negócios interrompidos, e sem saber quando e como poderão retornar à antiga normalidade, profissionais das áreas de turismo, entretenimento, festas, arte e cultura, alimentação, atividade física e beleza de Campos arriscam projeção de negócios para um futuro próximo. O otimismo nem sempre se revela.

Nélio Artiles | Esperança por vacina e regras para retomada

Em entrevista ao Sistema Terceira Via, o médico infectologista Nélio Artiles cogita que, quando as atividades econômicas forem liberadas pelos governantes, uma série de regras deve ser adotada. Ele defende atitudes de prevenção pela população. “O distanciamento social é aconselhável. Quando for permitida a volta ao trabalho, a higienização de mãos e uso de máscaras serão indispensáveis”, acredita.

Coisa de cinema

A pandemia de Covid-19 parece um filme de terror ou suspense. Ainda não se sabe sobre o futuro das salas de cinema de todo o país. Segundo a Agência Nacional de Cinema (Ancine), o Brasil conta com cerca de 3.500 salas de exibição. Por causa da aglomeração, estima-se que o público vai demorar a sentir confiança para voltar a frequentar os cinemas. Na China, por exemplo, algumas salas reabriram em março, mas o público não se animou e não compareceu.

Cinemas vazios durante pandemia

Campos conta com dez salas de projeção, além de três cineclubes. Foram programadas para até junho estreias de títulos de sucesso como “Velozes & Furiosos 9”, “Mulan” e “Mulher Maravilha”, além de filmes brasileiros. Administradores das salas de cinema não sabem mais quando serão lançados. A equipe do Terceira Via procurou pelas gerências dos cinemas de Campos, mas não obteve retorno. Nos sites das redes Kinoplex e Cine Araújo nenhum filme é mencionado. Há  estreias programadas para julho, porém, é preciso aguardar confirmação.

Apoio aos artistas

Artistas em geral estão de mãos atadas em suas ocupações. As atividades culturais devem ser as últimas a serem retomadas após o fim da pandemia do novo coronavírus. Em Campos, a superintendência de Entretenimento e Lazer diz que busca viabilizar parceria público-privada para incentivar o segmento, mas não há condições financeiras para a realização. “Mesmo durante a pandemia trabalhamos para agilizar os processos existentes para pagamento dos cachês a profissionais que ainda não receberam. Este processo é acompanhado pela Secretaria de Fazenda”, afirma Fabiano Gomes.

Fundação Cultural estuda apoio aos artistas (Foto:Arquivo)

Para Cristina Lima, presidente da Fundação Cultural Jornalista Oswaldo Lima, toda crise traz algum aspecto positivo em seu bojo. “No caso da pandemia, constatamos como a cultura e as artes, em geral, nos salvam do tédio, do vazio, além de amenizar nossa melancolia”, destaca. Ela acredita que o setor vai sofrer, pois dependerá da retomada da economia para obter investimentos. Ela arrisca sobre o futuro das atividades.

“Vai ser uma vivência nova para todos nós: artistas, produtores, gestores e público. Os espaços culturais estão inseridos neste grande processo de mudança que o mundo está vivendo e sua utilização está vinculada à adequação a uma nova realidade. É bastante preocupante. O Conselho Municipal de Cultura mantém diálogo com a classe para buscar alternativas que amenizem o problema”, diz Cristina.

Último espetáculo

Katiana Rodrigues na única apresentação teatral em 2020 (Foto:Antônio Cruz)

A atriz Katiana Rodrigues foi a primeira e última artista campista a se apresentar no Teatro de Bolso este ano. O espetáculo “Traídas e traidoras: somos todas Capitu”, de Arlete Sendra, estava em cartaz de 12 a 15 de março quando o decreto estadual proibiu o funcionamento de cinemas e teatros por conta da aglomeração.

“Não tínhamos ideia do que realmente estava acontecendo. Informações desencontradas. Recebi mensagens de pessoas que não foram por medo. E recebi também mensagem de uma médica amiga pedindo para eu ficar quietinha em casa porque era tudo muito perigoso. Tantos projetos suspensos, nenhuma perspectiva de retorno. O mais importante agora é ficarmos seguros. Cada artista encontra uma forma de extravasar e exercitar sua arte, como vem acontecendo com as “lives”, comenta.

Diretor Fernando Rossi no Teatro de Bolso (Foto: Fernando Cerqueira)

Para o diretor do espetáculo e também do Teatro de Bolso, Fernando Rossi, há uma mutação em curso na cultura, pautada em objetivos financeiros e emergenciais ou no mero gesto criativo. “No momento, não temos a dimensão onde o giro viral das artes da cena nos levará provocado pelo Coronavírus. Há uma potência de reinvenção, de criatividade, de inovação, que estamos longe de prever”, explica.

Malas desfeitas

Empresário do setor de turismo Rildo Junior (Foto:Carlos Grevi)

O empresário e agente de viagens, Rildo Junior, afirma que a Covid-19 colocou o turismo em seu pior momento na história. No Brasil, o setor do lazer basicamente zerou a demanda por viagens, e o turismo de negócios, diminuiu cerca de 85%. “Nunca, antes, nenhuma situação causou tanta insegurança aos passageiros, nem mesmo guerras e atentados terroristas chegaram próximo ao momento que vivemos. É um momento de incertezas e desmotivação”, explica.

Rildo Junior salienta que o setor do turismo é o único que movimenta todos os outros setores, além dos agentes de viagens, hoteleiros, empresas aéreas, receptivos, atrações turísticas, o setor impulsiona os restaurantes, padarias, bares, lojas, táxis, construção civil. “Todos estão sendo afetados, sem dúvida. As empresas aéreas, hotéis e agências de viagens são as que estão sentindo mais intensamente nesse momento”, destaca.

De acordo com o empresário, a maior expectativa é que surja o quanto antes um tratamento eficaz ou uma vacina que imunize a população contra o vírus. “Viajar é uma necessidade para muitas pessoas, eficaz em tratamentos até em questões psicológicas. As pessoas não vão deixar de viajar. Nesse primeiro instante, terão que adotar medidas protetivas como máscaras e álcool em gel, além dos hábitos higiênicos como a lavagem das mãos”, defende.

Beleza, decreto, portas fechadas

Priscila Nogueira é empresária do setor de beleza (Foto:Divulgação)

Mesmo após a publicação do decreto do presidente da República que inclui academias, e o setor de beleza na lista de “serviços essenciais”, o que prevalece na prática é o entendimento dos estados e dos municípios que, no caso do Rio de Janeiro e de Campos, ainda determinam o fechamento desses estabelecimentos. Enquanto isso, empresários do ramo, como de muitos outros, têm tido de se reinventar para se manter no mercado e na cabeça das pessoas. Alguns preveem  mudanças após o fim da pandemia.

A empresária Priscila Nogueira tem feito consultorias online durante o isolamento social. Entrega produtos nas casas dos clientes e investe no marketing digital para que a marca do salão não seja esquecida. “Para os clientes que já faziam procedimentos como coloração continuamente, fornecemos os produtos e orientações para que consigam aplicar em casa. Fazemos vídeos nas nossas redes sociais com dicas de hidratação, penteado. O objetivo é continuarmos presentes nas vidas das pessoas”, disse.

Quanto às perspectivas para o futuro, Priscila acredita que “as coisas não voltarão ao ‘normal’ porque as práticas rotineiras passarão por transformações.

Promoção de serviços do salão de cabeleireiro

“Sempre prezamos pela higiene e pelo cuidado, mas quando o salão reabrir, vamos contratar um profissional da área da saúde para que nos ensine como proceder com a higienização e métodos de proteção ainda mais eficazes. Afinal, os estabelecimentos voltarão a funcionar antes da vacina e o vírus continuará circulando. Precisaremos nos prevenir”, explicou. A empresária também pretende fazer um rodízio de profissionais para evitar a aglomeração no salão.

“Entendemos que as pessoas, quando voltarem para as ruas, estarão estressadas, assustadas e exaustas. Então a experiência no salão tem que ser única, especial e, sobretudo, segura”, afirmou.

Lives permanecem

Mesmo após a liberação dos shows, as lives devem durar. Pelo menos essa é a opinião do jornalista e produtor de eventos Cláudio Amaral. Ele ressalta que todos os grandes artistas têm lucrado muito com esses shows feitos ao vivo, mesmo com o intuito de ajudar o próximo e pode ser uma alternativa para os artistas que tiveram a renda reduzida ao máximo nos meses de pandemia.

Produtor de eventos Cláudio Amaral (Foto: Carlos Grevi)

“Os artistas e suas equipes precisam sobreviver. A realidade é que hoje ninguém mais vende CD´s ou DVD’s, e o YouTube paga muito bem de acordo com o número de visualizações. Dessa forma, certamente, as lives irão permanecer”.

Para Cláudio o retorno de eventos, como shows, deve acontecer de forma gradual, de acordo com a capacidade do local. Ele acredita que a liberação deve ocorrer primeiro para os locais de capacidade menor, em seguida os médios e, por último, os de grande capacidade.

Antes do isolamento social, Cláudio Amaral produzia cerca de 150 shows por ano. Agora, os que já estavam marcados foram adiados e sua renda reduzida. Para continuar trabalhando, ele faz assessoria de marketing e vendas on-line. “Um evento nacional gera, em média, 200 empregos, diretos e indiretos. Foi uma perda muito brusca para vários profissionais”, afirma o produtor.

Novos hábitos nas academias

Empresário do ramo fitness Diogo Martins (Foto:Carlos Grevi)

Aparelhos instalados a uma distância de 1,5 metros, álcool 70, que deverá ser utilizado na higienização do ambiente e no uso pessoal dos alunos, limite de pessoas por metro quadrado, e uso de máscara. De acordo com o empresário Diogo Martins, essas são algumas das medidas que os donos de academia deverão adotar na volta das atividades pós pandemia. As orientações são do Conselho Regional de Educação Física (Cref).

Para Diogo, as aulas on line, modalidade que surgiu durante o isolamento social, não devem continuar. “As pessoas gostam de interação, socialização e precisam ser motivadas a fazer atividade física, por isso, não acredito na continuidade desse mercado”, diz

Diogo Martins tem academia há nove anos e emprega diretamente 17 famílias direta e indiretamente. Ainda não houve demissão porque o empresário suspendeu os contratos de trabalho dos funcionários. Dessa forma, os salários têm sido pagos integralmente pelo Governo Federal. “Caso continue o isolamento social e a Medida Provisória chegue ao fim e não seja renovada, infelizmente, terei que demitir”, explica.

À espera de comemoração

Faride e Jacqueline Abdu Neme (Foto:Divulgação)

Jacqueline Aiex Abdu Neme é sócia do Buffet Abdu Neme, junto com a irmã, Faride. São 20 anos no mercado de festas e eventos. Para a empresária, serão necessárias várias mudanças para a volta dos eventos.

“Todas as festas foram adiadas para o final do ano ou para 2021. A gente vai sair disso tudo um pouco despedaçado, o país todo vai sofrer, mas temos esperança. Acredito que a volta será aos poucos e com algumas restrições. Quem trabalha com alimentação já tem uma série de hábitos de higiene, mas acho que isso vai ser ainda mais reforçado. Teremos que nos adaptar às máscaras e luvas. Acredito que até os garçons trabalharão assim. Estamos pensando nisso”.

A supervisora de vendas Ane Silva, da Casa de Vidro Supreme, um dos maiores espaços de festas de Campos, espera que os eventos voltem ainda este ano. Mas, segundo ela, os locais dos eventos também deverão se adequar, principalmente em relação ao distanciamento.

Supervisora de vendas da Casa de Vidro, Ane Silva

“Acredito que após a pandemia terão algumas restrições. Como a Casa de Vidro tem um espaço interno muito grande, com pista de dança e também mesas grandes, poderemos fazer os eventos com um distanciamento maior. Acredito em pessoas mais conscientes. Estou esperançosa que todas essas restrições não vão se estender até o final do ano. Creio que os eventos voltarão com menos pessoas. Nos resta esperar para ver o que vai acontecer. Estamos todos na mesma situação, ninguém tem controle”.

Outra área impactada nos eventos sociais é a de filmagem. Sem festas e shows, trabalhos foram interrompidos. Porém, a expectativa do filmmaker Max Farias, diretor de criação da Maximus Films, é que a área de vídeo seja ainda mais requisitada após a volta dos eventos.

Max Farias é filmmaker em Campos (Foto: Divulgação)

“No próximo ano, acredito que a gente ainda vá passar por muitas lutas, mas a expectativa é que será um novo começo. Pessoas não deixarão de dar valor ao que precisam. Neste período todos estão mais sensíveis, mais próximos dos seus familiares. Isso pode fazer do vídeo uma lembrança para sempre, acabará valorizando ainda mais a área”, conclui.