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Preço do petróleo cai e preocupação aumenta

Tudo isso afeta a receita campista

Campos
Por Redação
3 de maio de 2020 - 6h00

POR MARCOS CURVELLO E OCINEI TRINDADE

Após o preço do petróleo cair abaixo dos US$ 20 por barril na Inglaterra e despencar 25% nos Estados Unidos, produtores de petróleo se preparam para tempos difíceis. Apesar da disparada do valor do dólar americano, moeda em que são pagos royalties e participações especiais, a Prefeitura de Campos registrou, em abril, retração de 18,3% no valor da compensação em relação ao mês de março. Soma-se a isso, queda na arrecadação de impostos municipais em decorrência da pandemia do novo coronavírus, ampliação das medidas de isolamento social e redução da produção de óleo e gás na Bacia de Campos pela Petrobras, o que lança o futuro econômico do município em uma zona de incertezas.

A Bacia de Campos, que historicamente foi a maior produtora do país, perdeu relevância nos últimos anos para a Bacia de Santos (SP), após descobertas de grandes campos produtores do pré-sal na região vizinha. O cientista social José Luis Vianna Cruz é responsável pelo programa InfoRoyalties da Universidade Candido Mendes.  Ele considera a questão mundial do petróleo muito complexa pelo grau elevado de imprevisibilidade e volatilidade. Desde o final de 2014, crises acontecem com a diminuição do ritmo de crescimento da China que gerou menor consumo e impactou o petróleo a nível mundial.

“No caso do Brasil, isso repercutiu mais gravemente em Campos, e, de certa forma, em 2010, impactou no pré-sal. Os desfalques econômicos para o Brasil são grandes. A situação do Rio de Janeiro é uma tragédia. A Petrobras, para resolver problemas de dívidas, vendeu ativos e retirou a presença no refino e na distribuição; na ponta dos postos, transporte, rede de gasodutos, e praticamente se concentrou na exploração e distribuição de petróleo, onde justamente se dá a crise. Há um baque profundo para a companhia”, diz.

O economista Ranulfo Vidigal comenta sobre a estimativa de crescimento do PIB do Brasil este ano após a crise mundial por conta da pandemia do coronavírus. O Fundo Monetário Internacional prevê queda 5% a 10% na economia do país. Para o estado do Rio, a situação é mais dramática, considera. “O petróleo pesa com 30% na arrecadação. O Rio deve encolher 5%. Cada ponto percentual representa 1 milhão de desempregados. As buscas por seguro-desemprego têm crescido. Foi de 11% nos primeiros 15 dias de março. A taxa de desemprego hoje em 12% deve chegar a 16 ou 17%. Uma crise social sem precedentes. Em poucas semanas,  os EUA perderam todos os empregos gerados desde 2009. O grau é elevado de problemas”, acredita.

 

José Luis Vianna

Crises sociais e financeiras

José Luis Vianna atenta para a crise humanitária e civilizatória. Segundo ele, é preciso compreender a importância do Estado que precisa para atender a todos os cidadãos sem exclusão. “A gente tem que repensar políticas públicas, reorganização do estado, federalismo, se voltar para as questões sociais, desmanchar o emaranhado do sistema fiscal brasileiro. recuperar a solidariedade e alteriedade. Temos que focar na emergência e na urgência. É  papel do estado reunir fundos públicos para promover humanidade e saúde, além do processo civilizatório”, avalia.

Em tempos de pandemia e preços baixos do petróleo, Ranulfo Vidigal acredita que a demanda de combustíveis nos últimos 60 dias deve ter caído 35% e 40%. “Nessa primeira fase de Covid com pessoas em lockdown no Brasil em relação ao mundo, imaginamos que a primeira fase esteja vencida na primeira quinzena de junho. A economia paulatinamente vai voltando com a retomada de confiança dos consumidores. Muitas lojas podem fechar por incapacidade de concorrência. Será um segundo semestre de recuperação lenta. Há dificuldades produtivas de petróleo, questões portuárias e cotação de minério de ferro. A safra agrícola em Campos deve ser boa e empregar cerca de 5 mil pessoas, gerando 60 milhões de salários na economia”, acredita.

 

Felipe Quintanilha

Dólar alto, mas insuficiente

O dólar vem registrando, nos últimos dois meses, altas históricas sucessivas, o que faz aumentar o valor repassado a estados e município produtores, já que royalties e participações especiais são calculados com base na moeda americana. Mas, segundo o secretário municipal de Desenvolvimento Econômico de Campos, Felipe Quintanilha, isso não é suficiente para recompor as perdas que a Prefeitura vem sofrendo com a crise do petróleo.

“A queda do barril Brent é muita mais significativa e impactante. Mesmo o dólar aumentando, não é capaz de impactar positivamente nos valores de royalties. Além disso, o dólar alto aumenta a despesa pública, uma vez que vários itens do custeio público e privado estão atrelados ao câmbio internacional”, explica.

O golpe nos cofres do município só não é maior porque o Supremo Tribunal Federal (STF) adiou mais uma vez, no último dia 24, o julgamento da liminar da ministra Cármen Lúcia que suspende lei que determina a redistribuição dos royalties do petróleo entre estados e municípios produtores e não produtores. O julgamento aconteceria no dia 29 de abril e ainda não foi remarcado.

Ranulfo Vidigal observa que o dólar acima de R$ 5 minimiza a queda de arrecadação, mas não evita a queda de repasses fiscais. “Um dólar caro reduz poder de compra das famílias, pois tem forte influência em produtos como alimentos, eletrodomésticos e serviços. Tem um fator positivo de receita líquida do petróleo, mas tem um efeito à frente de inflação efetiva que não será identificada pelos índices de preços ao consumidor em função da recessão”, diz.

 

Tezeu Bezerra

Redução de produção de petróleo

A Petrobras anunciou medidas para reduzir custos, incluindo corte da produção e descomissionamento de plataformas. Desde então, oito unidades foram colocadas em hibernação nos campo de Cherne, Namorado, Congro, Corbina e Garoupa, todos na Bacia de Campos. A isso se soma a pandemia do novo coronavírus, que vem reduzindo a demanda pela commodity em cerca de 76% em todo o Brasil, segundo o coordenador geral do Sindicato dos Petroleiros do Norte Fluminense (Sindipetro-NF), Tezeu Bezerra.

“A Petrobras anunciou que a intenção de produzir, em abril, 2 milhões de barris por dia, uma redução de cerca de 25% em relação a produção média de 2019, que foi de 2,7 milhões de barris por dia. A questão mais problemática, entretanto, não é a diminuição da produção em si, mas a forma como ela é feita”, alerta Tezeu, que aponta o fechamento de postos de trabalho e prejuízos econômicos indiretos. “Como a região Norte Fluminense é extremamente dependente do petróleo, a sua economia é voltada para esse setor, como restaurantes, hotéis, lojas e demais serviços. Com a queda da produção, demissão dos trabalhadores terceirizados e realocação de parte dos próprios, haverá uma grave penalização para a economia local”.

Para Felipe Quintanilha, a hibernação das plataformas impacta pouco para a Prefeitura Campos, pois já eram campos que produziam pouco e geravam, por sua vez, baixo repasse de royalties. “Com isso, a queda na arrecadação da nossa cidade não deve chegar a 2%. Entretanto, em relação ao impacto na economia e no comércio, ainda é difícil medir, mas, com certeza, será negativo”, prevê.

 

Pandemia e perda de arrecadação

A Firjan divulgou um estudo sobre os impactos da pandemia do novo coronavírus sobre a cadeia de óleo e gás, que prevê redução de 30% da produção na Bacia de Campos, além de uma queda do consumo de derivados em 50%. “Para o estado e municípios do Rio, isso reflete em menores arrecadações de royalties e de Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS)”, avalia.

A estimativa é de que a arrecadação diária seja de R$ 12,7 milhões/dia, montante 50,5% menor que a média de 2019 e pouco maior que o arrecadado em 2016, durante a crise do petróleo. A Prefeitura de Campos já sente os prejuízos causados pela covid-19. De acordo com Felipe Quintanilha, o Município teve queda na arrecadação de Imposto Sobre Serviço de Qualquer Natureza (ISSQN) e de Imposto sobre Propriedade Predial e Territorial Urbana (IPTU).

“A Secretaria de Fazenda observou, até o momento, uma queda de 20% na arrecadação do ISSQN no mês de abril, se comparado ao mês de março. Já no IPTU, foi observada uma queda de cerca de 40% na receita no mês de abril, se comparado a março. Essas porcentagens podem sofrer variação uma vez que o mês ainda não foi encerrado”, revela o secretário de Desenvolvimento Econômico. Será crucial o aporte de recursos federais nos Municípios, de maneira a compensar as perdas. É no Município que o cidadão usa saúde, segurança, transporte, educação e assistência social”, avalia.

Economista Ranulfo Vidigal (Foto: Silvana Rust)

O economista Ranulfo Vidigal lembra que o orçamento de Campos para 2020 foi autorizado pela Câmara Municipal em R$1,8 bilhão. “Considerando a perda de indenização do petróleo, perda de ICMS e perda de recursos fiscais federais, o valor deve chegar a R$ 1,5 bilhão já comprometidos com folha de servidores e contratos. Sobram R$ 250 milhões para pagar coleta de lixo, comprar remédios, tapar buraco de rua, trocar lâmpadas. Há uma grande restrição. O decreto de calamidade pública é pertinente porque o governo não deve cumprir a Lei de Responsabilidade Fiscal. O orçamento ficou muito aquém do necessário”, afirma.

José Luis Vianna Cruz defende o avanço no federalismo fiscal. Se não houver reformas, nosso caso ficará muito complicado. Nossa tragédia dos royalties e participações especiais será mais grave porque a gente cresceu para ser sustentado por uma renda bilionária que não tem mais. Temos uma base de custeio para um determinado nível de orçamento que não temos mais”, conclui.