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A ponte

Há 50 anos o Brasil dava início à construção de uma obra que pela grandiosidade e importância nem precisaria de nome

Guilherme Belido Escreve
Por Guilherme Belido
13 de outubro de 2019 - 0h01

Seria chamada e ficaria conhecida, apenas, como

A PONTE

Na realidade de hoje, os estádios desmontam, a Vila Olímpica 
é vexame internacional e nem o Arco Metropolitano escapa 

Em 1969 começava a
 a ser construída a Ponte
Rio-Niterói, – na época 
a 2ª maior do mundo

Até hoje, decorrido 
meio século, a ponte 
continua entre as 15 
maiores do planeta

Como, então, nos dias 
atuais, nem obras simples 
como estádio e ciclovia 
conseguem ficar em pé?

Fazendo uma mera observação que não exige trancar-se por vários dias num quarto escuro em exaustiva reflexão, salta a olhos vistos a modernidade dos últimos anos e décadas, que a tudo abraça e encampa, tornando mais fácil, ágil, seguro e eficaz qualquer coisa que se pretenda empreender, em especial no campo da alta tecnologia.
Matutando só um ‘tantinho’, surge a intrigante pergunta: não parece estranho que há 50 anos, em 1969, o Brasil tenha iniciado e concluído em menos de seis anos as obras da Ponte Rio Niterói  –  na época a 2ª maior do planeta, de imediato ganhando destaque como um dos principais monumentos da engenharia nacional e como tal reconhecida pelo mundo inteiro –, e agora não consiga fazer com que uma simples ciclovia fique em pé? Faz, cai. Faz de novo, cai de novo.
Andamos pra trás?

Porque, citando somente alguns poucos exemplos, as ciclovias desabam e matam gente, os viadutos cedem e racham e os estádios construídos para a Copa 2014 estão detonados.
Arco ‘Rouboteritano’ – Nem algo simples, como o Arco Metropolitano (asfalto em cima de terra batida) fugiu à incompetência. Está abandonado, sem iluminação, repleto de loteamentos clandestinos, tendas e acessos ilegais. Além da atividade irregular de extração de mineral, o lugar é o paraíso dos assaltos.
Pelo visto, o objetivo da “obra” foi bem simples: servir para que o ex-governador Cabral e seus comparsas roubassem dinheiro público.

O que significou a Ponte Rio-Niterói

Explicando o título da página, a Ponte Rio-Niterói, cujo nome oficial é Ponte Costa e Silva, de tão importante que foi – e que é –, nem precisou de nome. Quase tudo recebe uma denominação. Mas a ponte é conhecida como ‘A Ponte’ porque é única, porque na época foi um acontecimento mundial e não precisou de nomenclatura, como até hoje não precisa.
Para deixar bem delimitado o que se deseja “comparar”, lançou-se mão de tecnologia que não existia. Isso mesmo. Foi preciso criar tecnologia para que se fincasse vigas ao longo de 13,30 quilômetros no fundo da Baía da Guanabara.
A inovação, os desafios e o feito notável para os anos 60, os seriam também para os dias de hoje.
Para se ter ideia, dentro dos acanhados recursos da engenharia nacional de então, foi preciso superar obstáculos brutais, descortinar o desconhecido para, por exemplo, erguer o vão mais alto da obra, que não podia ter mais de 72 metros por causa dos aviões, nem menos de 60, para que os navios continuassem a navegar sobre as águas. Então, estamos a falar de um malabarismo técnico-estrutural sem precedentes.
Rainha e operários – Não por acaso, a rainha Elizabeth II veio ao Rio para visitar o local um pouco antes do início da construção. E também não ao acaso,  foi chamada de obra do século e apelidada de ‘Oitava maravilha do mundo’.
Com números questionados, oficialmente mais de 20 mil operários foram usados na construção. Os relatos indicam que 40 operários – fora engenheiros e técnicos – morreram em sua construção. Acredita-se, contudo, que o número de óbitos tenha sido bem maior.

Orgulho de uma cidade; orgulho do Brasil

Em um estado que hoje sofre as consequências da corrupção desmedida e com o País vivendo entre a incerteza política e a insegurança econômica – com a população padecendo sem emprego – nem parece que o Brasil, em especial o carioca, se encheu de orgulho quando a ponte foi inaugurada.
Foi uma festa. Não só os motoristas fizeram carreata o dia inteiro, como uma multidão invadiu a ponte cantando e festejando sua conclusão. Era orgulho pintado de verde-e-amarelo porque o Brasil estava no noticiário do mundo todo.
A travessia da Baía da Guanabara pelas barcas, que em virtude das filas chegavam a demorar de 4 a 6 horas, passou a ser de 10 a 15 minutos. E nos primeiros anos não houve cobrança de pedário.

O que mudou com a Rio-Niterói

Projetada pelo então ministro dos Transportes, Mario Andreazza, a  ponte transformou a paisagem do Rio que ganhou um novo cartão postal e revolucionou o trajeto entre dois importantes centros urbanos. No início, cerca de 15 mil veículos atravessavam a ponte por dia. Sem engarrafamento, gastava-se 10 minutos. Era um passeio.
Hoje, o fluxo varia entre 180 e 200 mil veículos/dia. Em situação normal e em horário comercial, leva-se de 40 a 50 minutos.
Com sua curva imponente, 50 anos depois ainda é a maior em extensão da América Latina e a 15ª do mundo.
As maiores – Como curiosidade, as quatro maiores pontes do mundo são chinesas, sendo a Dayang-Kunshan a mais extensa. Todas foram construídas nesta década.
Entre as 11 restantes, a maioria foi erguida nos anos 2000.  Somente as americanas Pontchartrain (1969) Atchafalaya Basin (1973) foram inauguradas antes da brasileira.

Enxergar o recuo é inevitável 

Aqui tratou-se da ponte e da qualificação técnica em construí-la entre as décadas de 60/70. Por outro lado, apenas focando o Rio (antiga Guanabara), nos anos 60 foram feitos os túneis Rebouças, Joá, Santa Bárbara e iniciadas as obras de abertura do Dois Irmãos.
Obra de grande avanço para seu tempo, merece registro o aterro e a via expressa do Flamengo. Também na década de 60, a Estação de Tratamento de Guandu e a construção de 40 quilômetros de túnel que acabou com a crise de abastecimento de água no Rio e com o sofrimento de boa parcela da população.
Hoje, tendo o Brasil a maior bacia hidrográfica do mundo, São Paulo, a cidade mais rica do País, não consegue vencer a falta de água.