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Centro de Campos acumula negócios fechados

Portas baixadas e anúncios de aluguel se tornaram visão comum no coração comercial da cidade, a sexta mais empreendedora do Rio

Campos
Por Marcos Curvello
15 de julho de 2019 - 0h01

Números da secretaria municipal de Fazenda apontam fechamento de 238 estabelecimentos comerciais em 2019. (Foto: Silvana Rust)

Basta uma volta pelas ruas do Centro de Campos para se deparar com as portas fechadas. Letreiros de lojas que não existem mais, placas de “passa-se o ponto” ou “aluga-se” e avisos de mudança para bairros mais distantes são visões comuns em alguns dos endereços comerciais mais disputados do município. Resultado de uma crise econômica que começou em 2014 e não poupou novos e nem antigos empreendedores. De acordo com um levantamento da secretaria municipal de Fazenda, 238 estabelecimentos comerciais encerraram suas atividades somente em 2019.

O número considera os seis primeiros meses do ano e apresenta pouca variação em relação ao índices que vêm sendo registrados nos últimos dois anos. Ainda segunda a Fazenda, 494 negócios fecharam as portas em 2018 e 464, em 2017.

Um dos empresários que decidiu pelo fechamento foi Luiz Carlos Chicri. Referência no ramo de materiais esportivos em Campos e dono de uma das maiores lojas da rua João Pessoa, tradicional logradouro do comércio campista, Chicri optou por encerrar as atividades de duas unidades em janeiro deste ano — antes, já havia fechado uma terceira. As condições do mercado e o e-commerce contribuíram para a decisão, afirma.

“Os grandes fornecedores de material esportivo começaram a dificultar a venda para os pequenos e médios lojistas, impondo a compra de maior quantidades de produtos para ter acesso a melhores descontos e diminuindo os prazos de pagamento. Os grandes revendedores conseguem manter lucros acima de 100% nessas condições, mas os menores, não”, explica.

Reconhecido como o maior revendedor de grandes marcas de material esportivo no interior do estado do Rio e pioneiro na comercialização de produtos que se tornariam procurados no setor, Chicri destaca, ainda, a crise econômica que afetou o país, o estado e o município em diferentes intensidades nos últimos cinco anos e a concorrência da Internet.

“A crise tirou as pessoas da rua. Elas pararam de comprar. E ainda tem o comércio eletrônico. Muita gente ia à loja, experimentava um tênis, por exemplo, dizia que voltaria e dias depois, aparecia com o produto no pé. Comprado pela Internet, certamente”, conta.

Concentração de renda

De acordo com o economista Alcimar Chagas, o fechamento de empresas em Campos é fruto não só da crise econômica que atingiu o Brasil a partir de 2014 — e a cidade, mais especialmente, com a queda do preço do barril de petróleo no mercado internacional —, mas também de uma construção sócio-histórica.

“Campos carece de atividades produtivas que gerem massa de renda para consumo. A atividade industrial é concentrada na cana-de-açúcar, que está em declínio. Sobra o setor de serviços, já que o município é mais central e polariza cidades da região, contando com agências, delegacias, representações e unidades de bancos, da Justiça e dos governos estadual e federal, por exemplo. Mas, a concentração de renda impede a consolidação do consumo”, diz o economista.

Alcimar explica que os campistas com maior poder aquisitivo acabam gastando seu dinheiro fora do município e o restante da população não é capaz de sustentar o comércio local. “Quem tem renda maior, viaja. Vai para Búzios ou para a capital, por exemplo, e acaba gastando nessas cidades. O restante da população sobrevive com uma média de dois salários mínimos mensais. Muitas famílias estão endividadas. É uma combinação que não ajuda a atrair novos empreendimentos e nem a manter existentes. Os resultados são dezenas de negócios fechados”, diz.

Para economista, abertura de novos negócios é fruto do desemprego. (Foto: Silvana Rust)

Cidade empreendedora

Os números da secretaria de Fazenda são globais e incluem empresas com diferentes regimes tributários e até microempreendedores Individuais (MEIs). Uma análise dos números, porém, revela um aparente paradoxo: enquanto as portas fechadas se multiplicam no Centro, o município registra mais estabelecimentos comerciais abertos.

O saldo positivo é de 2.643 negócios em 2017, 2.954 em 2018 e 1.622 em 2019. Isso coloca Campos como a sexta cidade mais empreendedora do Estado do Rio.

Mas, Alcimar Chagas atenta para o que chama de “empreendedorismo de necessidade”. Segundo o economista, trata-se de um resultado direto do fechamento de postos de trabalho formais e normalmente resulta em empresas de vida curta, devido à falta de preparo de seus proprietários.

“Empreender não é criar negócio simplesmente. Um marceneiro fica desempregado e abre uma loja. Mas, ele não está ciente das dificuldades do setor, não tem um estudo de mercado, não sabe lidar com a burocracia, nem se manter competitivo. Aí fecha, porque, normalmente, não tem as competências necessárias. São números de alta rotatividade”, finaliza.