A cada dois segundos, uma mulher é agredida de forma física ou verbal no Brasil, segundo dados do Instituto Maria da Penha. E para evitar que os agressores voltem a cometer estes crimes ou façam algo ainda pior, antes de uma possível prisão, as vítimas têm uma importante aliada na busca de garantir a segurança: a medida protetiva, que é um dos mecanismos criados pela Lei 11.340, a Lei Maria da Penha. Entre os tipos de medidas mais comuns garantidos pela lei estão o afastamento do lar e o impedimento de contato com a vítima a uma distância de 300 metros. Em Campos, este ano já foram 330 pedidos de medidas protetivas solicitados à Justiça, número 43,49% maior do que os 177 solicitados no mesmo período do ano passado (01 de janeiro a 09 de julho). Atualmente, no total, mais de 3 mil mulheres estão amparadas por algum tipo de medida protetiva no município.
Para a Delegada Ana Paula de Carvalho, responsável pela Delegacia Especial de Atendimento à Mulher (Deam), embora crescentes, não é possível afirmar ao certo o motivo do aumento nos números. “A medida protetiva é o meio inicial que a vítima tem para que o agressor não se aproxime dela, é uma maneira de conter uma situação de violência que está acontecendo. Mas a gente nunca sabe se os casos aumentaram porque a violência está maior ou se as vítimas estão denunciando mais. A violência doméstica no Brasil é uma epidemia e hoje as mulheres sabem que podem denunciar. Esta violência só vai mudar quando os homens entenderem que mulher não é propriedade de ninguém”.
Vítima de uma agressão do ex-marido, A. (que não terá o nome revelado) hoje é uma das mais de 3 mil campistas amparadas judicialmente por este recurso. No caso dela, o agressor está impedido de se aproximar ou entrar em contato.
“No meu caso, as medidas têm um prazo de 90 dias e ainda estou dentro deste período. Por enquanto, tudo está funcionando bem. Me sinto um pouco mais segura, pois creio que as medidas protetivas têm sua importância e seu valor para inibir o agressor de se reaproximar”, afirmou A.
São vários os tipos de medidas protetivas disponibilizados atualmente em lei, mas o motivo da medida, na maioria das vezes, é manter o casal afastado até que se apure efetivamente o que aconteceu. Segundo o juiz Geraldo Batista Júnior, responsável por emitir as medidas protetivas (ou cautelares) no Juizado da Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher, o aumento no número dos pedidos é considerado grande.
“Nós temos problemas em todas as classes sociais. A maioria das vítimas é pobre e acredito que seja porque temos um número maior de pessoas nestas condições, mas a violência está em todas as classes sociais. Quase sempre o motivo das agressões é bebida. Posso dizer que cerca de 20% é problema com drogas e 80% com bebida. São pessoas que saem de si e agridem suas companheiras. Este cara fica ‘corajoso’ e coloca pra fora um sentimento de propriedade que ainda existe na nossa sociedade”, explicou o juiz.
Em Campos, a OAB Mulher, que faz parte da Ordem dos Advogados do Brasil, promove ações
para orientar mulheres e até mesmo evitar que seja necessário fazer o pedido de uma medida protetiva. “A OAB Mulher promove debates e palestras de conscientização abertas ao público. Qualquer pessoa pode participar e é importante que ela participe, porque às vezes a vítima está em uma situação abusiva e não vê. Ela sofre violência psicológica e moral e acha que não vai acontecer a agressão física”, afirmou Kelly Viter, presidente da comissão OAB Mulher.
Tornozeleiras vibram e apitam quando agressor se aproxima a 200 metros da vítima
Desde junho, agressores de mulheres do estado do Rio podem usar tornozeleiras eletrônicas idênticas às utilizadas na monitoração de presos do regime semiaberto. A determinação, da 5ª Vara de Violência Doméstica, é um meio de garantir que a medida protetiva por afastamento seja cumprida.
“Este aparelho é uma boa saída, já que nem todo caso prevê prisão e garante a integridade física da vítima quando ela está em risco”, afirmou Kelly Viter, da OAB Mulher.
O monitoramento é feito pela Secretaria de Estado de Administração Penitenciária (Seap). Na prática, o agressor é obrigado a usar uma tornozeleira e a vítima fica com um aparelho que apita e vibra no momento em que o agressor está em um raio de 200 metros próximo dela. O objetivo é fazer com que ele seja impedido de se aproximar da mulher e que ela tenha tempo de pedir ajuda, como, por exemplo, ligar para o 190.
Inicialmente a Seap vai disponibilizar 20 equipamentos. Até a última quarta-feira (10), a Justiça já havia autorizado a utilização de dois aparelhos pelas vítimas.
“O uso da tornozeleira eletrônica, que já é utilizada no nosso sistema desde 2011, fará com que o estado atue de maneira mais repressiva no combate à violência contra a mulher”, afirmou o secretário, Alexandre Azevedo.
Quando as medidas não são suficientes
Infelizmente, nem todos os casos em que a vítima está amparada judicialmente através de uma medida protetiva têm um desfecho esperado. Há também aqueles em que os agressores não cumprem a determinação judicial, se aproximam da vítima e agridem ou até mesmo matam estas mulheres. Exemplo é o caso da professora Regiane da Silva Santos, assassinada na última quarta-feira (3), próximo de uma academia em Travessão, pelo ex-marido Paulo Rangel, que foi visto por testemunhas e também confessou o crime.
De acordo com conhecidos, Regiane já havia se separado de Paulo outras vezes e, nesta última, estava afastada dele há cerca de dois meses. A professora estava amparada por medida protetiva determinada pela Justiça, o que deveria fazer com que o suspeito não se aproximasse dela. A proibição, porém, não foi suficiente para impedir o crime.
Nos casos em que o agressor descumpre a medida, mesmo que não haja crime de feminicídio, ele pode ser preso imediatamente. “Se este agressor for recapturado em flagrante, essa prisão não cabe nem fiança. Se não for em flagrante, a vítima pode ir à Delegacia da Mulher e nós vamos registrar o caso e pedir a prisão do autor. É claro que há alguns casos de autores que não cumprem a medida protetiva, mas esta é hoje a forma mais rápida que a vítima tem de estancar aquela violência momentânea”, explicou a delegada Ana Paula.