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História da Língua é apresentada no Museu de Campos

Edinalda Maria Almeida fala sobre rotacismo e outros comportamentos do idioma português na cidade e em outras regiões

Entrevista
Por Ocinei Trindade
28 de maio de 2019 - 17h36

Edinalda Maria Almeida é professora e pesquisadora da Língua Portuguesa (Foto:Reprodução)

Escrever, falar e se comunicar bem em português desafiam milhões de usuários da língua. Em Campos, o rotacismo é uma das marcas do falar local. Trata-se de um fenômeno e um dos tópicos da História da Língua, muito comum e relacionado ao preconceito linguístico que é a troca do “R” pelo “L”, além de omissão de letras na pronúncia, como “pobrema”, em vez de “problema”. Na sexta-feira (31), no Museu Histórico de Campos, às 19h,  acontece uma palestra sobre o tema com a professora Edinalda Maria Almeida da Silva. A entrada é franca.

Em atividade desde 1970,  Edinalda Maria tem formação em Língua Portuguesa, Língua Latina e História da Língua. Ela é especialista em Linguística Aplicada e em Comunicação e Cultura, além de ser mestra em Comunicação. Nascida em Campos dos Goytacazes, é da Baixada da Égua, região de Caboio, “onde cabelos e canaviais são penteados pelo vento”,  define. Pesquisar sobre o português e o rotacismo estão entre suas ocupações profissionais. A professora de várias gerações de alunos em Campos falou sobre sua pesquisa e de outros assuntos relacionados ao idioma. 

 

Em tempos de mídias digitais, ensino nas escolas avaliado, a quantas anda a nossa língua portuguesa?

Anda muito bem, desafiando os que previam uma derrocada diante das mídias sociais e a natural divulgação do internetês.

O rotacismo em Campos é motivo de chacota ou zombaria, não é? Porém, a prática é comum. Isso ocorre em todos os lugares do Brasil?

Sim, é. É uso comum e deve ser respeitado como fenômeno que não é privilégio do Brasil. Há muitos registros de variações entre autores consagrados como Camões, padre Vieira, Sá de Miranda e Fernão Lopes. Em países como a Itália e a Romênia, a tendência rotacizante é naturalmente encarada e estudada. No Brasil é também objeto de pesquisa, mas damos asas a uma espécie de ‘racismo linguístico’, infelizmente.

Historicamente, a língua está sempre sendo transformada, não é? Como avaliar o presente da língua portuguesa na cidade de Campos e em outros lugares do país?

Avalio a Língua Portuguesa, em qualquer tempo, como uma bela possibilidade de construção e afirmação da identidade. Somos um étnico que, por cima das linhas cruzadas de tantos fatores de diferenciação, fala o português brasileiro, amaciado pelas línguas indígenas, adocicado pela influência de África. Nosso registro campista resume, felizmente, muitas raças e castas de homens e, portanto, toda a genialidade desta planície, chamada a criar uma condição humana, quiçá mais solidária.

Você acompanha também a prática e o uso da língua em outros países lusófonos, além de Brasil a Portugal?

Sim. Os países da CPLP , nossos irmãos maternos, vivenciam também as influências externas e as internas na língua de origem porque saboreiam o grande número de dialetos, com os quais aprendem a conviver.

O que você pretende destacar em sua palestra sobre português e rotacismo?

Inicialmente o fato de que rotacismo não é feio, nem bonito e sim, fenômeno linguístico enriquecedor para a liberdade da Língua. Também apoiada em teóricos, como Rousseau, Bagno e Rajagopalan, tentar elucidar que a fala não é uniforme e que não se pode estigmatizar as pessoas de pouca escolaridade porque não dominam o chamado registro culto. A Gramática não é a Língua; é apenas uma descrição parcial dela.

O que precisamos aprender sobre nossa língua e sobre nossos hábitos de comunicação e falares?

Ah, há tanto a aprender! Serei eterna aluna de meu Curso de Letras. Creio que o principal é entender que a opção de mandar ‘frechas’ ou ‘frores’ não anula o emissor; testa o receptor. O que há por trás de uma Língua considerada formal, sem rotacismo, mas pontilhada de gerundismos, verbos mal conjugados, neologismos absolutamente empobrecedores? A resposta se resume a duas palavras: dominação e opressão. Esse menosprezo ao falante o torna mudo nos seus anseios.

O interesse pelo próprio idioma e pelas práticas de comunicação é percebido de que modo por profissionais de ensino como você?

Creio que os que optaram pelo estudo da Língua Portuguesa não imaginavam que teriam diante de si a deliciosa oportunidade de conhecer a cartografia, a fisiologia , a metadiscussão que inclui, em si, as impossibilidades dela mesma! Isso é fascinante, instiga, mas é também o que nos permite não emudecer, aceitar ou sacralizar.

Edinalda Maria e Tony Belloto na Bienal do Livro de Campos (Arquivo)