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Entrevista com a Missionária Rosângela das Dores: há uma luz no fim do túnel

Cristolândia desenvolve em Campos trabalho que recupera vidas de mulheres destruídas pelas drogas, principalmente o crack

Geral
Por Redação
5 de novembro de 2018 - 0h01

Uma difícil missão de combate ao uso de drogas tem sido cumprida em Campos. Há cerca de dez anos, a Cristolândia já recebeu e tratou, gratuitamente, de quase 500 mulheres dependentes químicas que vêm de várias partes do Brasil resgatadas de cracolândias. À frente desse projeto quase oculto está o trabalho incansável da missionária Rosângela das Dores que coordena a casa mantida exclusivamente por voluntários e igrejas evangélicas.

Engana-se quem pensa que o trabalho que acontece lá é mais um. Diferente disso, a maioria das mulheres que entra no local sai de lá transformada, não só fisicamente, mas emocionalmente e espiritualmente. Principalmente, liberta do vício que aprisiona, por meio de uma equipe multidisciplinar também voluntária. Rosângela foi homenageada pelo Sistema de Comunicação Terceira Via, no aniversário de seis anos da empresa e, merecidamente, ganhou o prêmio “Sou Terceira Via” pelo trabalho que exerce. Aqui, ela conta parte de sua história e a história de transformação das mulheres dependentes químicas.

O que representou para a senhora receber o prêmio “Sou Terceira Via”?

Ao receber este prêmio me senti honrada. Não faço meu trabalho esperando reconhecimento, nem gosto de ficar em evidência, mas é uma honra poder representar os batistas campistas através desta empresa séria e de grande reconhecimento que é a Terceira Via.

A senhora é uma batalhadora a frente da Cristolândia, em Campos, e não mede esforços para ajudar ao próximo, principalmente as mulheres dependentes químicas. Como surgiu essa missão na sua vida?

Meu chamado se deu às experiências que eu também tive com as drogas. Eu tive problemas com o álcool, em 1995, precisei me internar para tratamento. Quando me recuperei foi quando eu vi que minha vida podia ser útil para abençoar outras vidas. Desde então sempre me dediquei a este ministério. E quando tive a oportunidade de iniciar o projeto Cristolândia, que pertence a junta de Missões Nacionais, que funciona como uma agência missionária da Convenção Batista Brasileira.

Como é feito o trabalho de resgate nas ruas até a chegada das dependentes químicas à Cristolândia?

A abordagem, que tratamos como chamado de busca ativa, acontece por meio dos missionários que são preparados para ir às ruas e cracolândias de todo o Brasil. Eles levam o amor, fazem convites para um banho, oferecem roupas limpas e alimentos. Neste momento é explicado como funciona o projeto e é feito o convite para o tratamento. Nós não fazemos a busca ativa em Campos, mas nós recebemos as moças que desejam o tratamento.

E a transformação que é feita na vida delas após aceitarem a ajuda, como a senhora classifica?

Chamo de milagre. É nítido quando elas realmente se deixam ser tratadas por nós como são transformadas de dentro para fora. Antes, viviam sem nenhuma valorização pessoal, muitas viviam jogadas pelas ruas e tratadas de qualquer maneira, sendo humilhadas, tratadas como lixo humano. No tratamento, aconselhamos e encaminhamos ao estudo e trabalho para serem empoderadas e terem uma vida digna.

Como o estudo da Bíblia e a religião Evangélica interferem no processo de libertação do vício das drogas?

A Bíblia tem respostas para todas as coisas. É um manual para nossa vida. As meninas recebem porções deste manual diariamente e elas aprendem a fazer suas escolhas .Cremos que é a palavra de Deus que poder transformar uma vida . “E conhecereis a verdade e a verdade vos libertará”. Este texto encontra-se em João, capítulo 8, verso 32.

Ao longo desses cerca de 9 anos da Cristolândia feminina em Campos quantas já passaram por lá? O índice de restauração e retorno ao lar é satisfatório?

Neste tempo recebemos mais ou menos 450 mulheres, o que nos deixa contente, pois não temos rotatividade. É muito satisfatório quando conseguimos acompanhar através de grupos do Whatsapp e outras redes sociais as mulheres que passam pelo projeto e voltam para o convívio social e familiar.

Qual história de vida das meninas que mais te marcou? Por quê?

São vários casos, mas a história de uma menina que teve a mãe assassinada ainda quando ela era bebê, não conheceu o pai, cresceu vendo a avó e tios assistindo a vídeos impróprios para menores. Ela, aos nove anos, já conhecia o mundo das drogas e elas aprendem a fazer suas escolhas.Cremos que é a palavra de Deus que poder transformar uma vida . “E conhecereis a verdade e a verdade vos libertará”. Este texto encontra-se em João, capítulo 8, verso 32. Um senhor — que também havia cuidado da mãe dela quando criança – a levou para sua casa e começou a cuidar dela. Ele ensinou o que ela precisava para sobreviver, como cuidar de uma casa, cozinhar. Porém, ela não conseguiu deixar o vício. Aos treze anos, já tinha um filho. A conheci com dezoito, já com três filhos e totalmente destruída pelas drogas. A encontrei com muitas deficiências e vulnerabilidades, mas ficou uma moça linda. Cuidamos dela como podíamos, pois através de vários voluntários profissionais que temos, ela teve um bom tratamento. Em um dado momento, durante o tratamento, a “família” disse que ela precisava voltar, me senti impotente. Depois de algum tempo, recebi a notícia de óbito por overdose.

Quais os principais desafios que a Cristolândia enfrenta hoje?

Um grande desafio é conseguir trabalhar com as famílias. Temos uma equipe de psicólogos e assistentes sociais (que prestam serviços voluntários) que são incansáveis na busca de aproximar as meninas das famílias durante o tratamento, pois temos o compromisso de tratar, reinserir na sociedade e reintegrá-las a família.

Quanto tempo em média dura o processo de libertação do vício? É possível que os danos deixados pelo crack, por exemplo, sejam revertidos?

Nosso programa tem um ciclo para dois anos. Alguns casos podem ser revertidos. Temos visto muitos milagres acontecendo, pessoas comprometidas com drogas como o crack há anos conseguirem se libertar sem sequela nenhuma.

Quem já teve a oportunidade de ver o aspecto físico de uma pessoa durante o vício do crack, depois que ela se liberta do vício se surpreende. A senhora tem bons exemplos disso pra contar né?

Tenho muitos, por exemplo de uma jovem que estava tão debilitada que seu companheiro a havia abandonado. Resgatamos, cuidamos e quando a levamos para ver o filho, depois de quase um ano, o ex-companheiro olhou para ela sem acreditar e disse que queria essa transformação para ele também. Foi aí que o encaminhamos para tratamento também em uma de nossas unidades. Hoje, estão casados e felizes.

O que a senhora diria hoje para um jovem e/ou adolescente para evitar o ingresso deles no mundo das drogas?

Jovem, temos milhares de exemplos de que a dependência química faz com o ser humano. Portanto, seja inteligente e faça a diferença. Não use drogas, evite lugares, pessoas e hábitos que possam vir a te levar a se relacionar com elas. Aprenda com erros alheios.