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Especialistas analisam eleições para governador e presidente

Rodrigo Lira e José Luis Vianna Cruz respondem as mesmas questões sobre Bolsonaro, Witzel e o comportamento do eleitor

Opinião
Por Ocinei Trindade
15 de outubro de 2018 - 15h36

José Luis Vianna Cruz e Rodrigo Lira comentam o cenário político nacional e estadual (Fotos: Silvana Rust)

As eleições para presidente da República estão na pauta diária dos brasileiros. A disputa entre Jair Bolsonaro (PSL) e Fernando Haddad (PT) divide o eleitorado e as opiniões. No estado do Rio de Janeiro, também haverá segundo turno para governador entre Wilson Witzel (PSC) e Eduardo Paes (DEM). Na entrevista a seguir, dois especialistas abordam os assuntos e as eleições. São eles: Rodrigo Lira, administrador e professor da Universidade Cândido Mendes e doutor em Sociologia Política pela Uenf; e José Luis Vianna Cruz – cientista social, mestre e doutor em Planejamento Urbano e Regional, pós-doutor  em Desenvolvimento Territorial e Políticas Públicas,professor da UFF e UCAM.

 

Como recebeu o resultado das eleições para presidente da República? As projeções dos institutos de pesquisa corresponderam aos números das urnas?

Rodrigo – As projeções corresponderam, sim. O Brasil amanheceu mais conservador como um todo., mais posicionado no centro-direita e com algumas surpresas nos estados. Houve um crescimento significativo do voto de protesto em Bolsonaro que se concretizou.

José Luis – As projeções não corresponderam aos resultados das urnas, mas não podemos culpar as pesquisas. Houve fatores muito dinâmicos, não visíveis e não captáveis pelas pesquisas, que influenciaram essas eleições.

O mesmo não ocorreu para governo do Rio de Janeiro que surpreendeu com Wilson Witzel para disputar o segundo turno com Eduardo Paes. Como avalia esse fato?

Rodrigo – O Wilson Witzel no Rio de Janeiro foi uma grande surpresa ao ir para o segundo turno, principalmente ter avançado e superado od 40% dos votos válidos. Isto é mais um efeito do fenômeno Bolsonaro que a gente atribui a um sentimento de protesto e revolta anticorrupção, antipetismo. Dias antes da eleição Bolsonaro declarou voto ao juiz Witzel. Isto fez diferença para  o governo do estado e para o Senado também com apoio dado a Arolde de Oliveira que superou o favorito na disputa, Cesar Maia.

José Luis – A subida rápida, meteórica e em curto espaço de tempo do Witzel e de vários candidatos, tanto a governador, como em Minas Gerais e outros, para deputados, como nos vários estados, e senadores, como o caso típico de S. Paulo e Rio, para ficarmos só em poucos e importantes exemplos.  Fatores imponderáveis atuaram nessas eleições. Por enquanto, são especulações, mas podemos afirmar, sem medo de errar muito, que a onda do 17 arrastou os candidatos de prefixo 17. A atuação da campanha do 17 nas redes sociais foi extremamente profissional, com prováveis ligações de grupos relacionados com o esquema que influenciou nas eleições americanas, elegendo o Trump. As fake news e o controle exercido sobre a seleção e circulação das informações nas redes sociais foi fundamental como ferramenta. O conteúdo é outra coisa.

Em Campos, Bolsonaro venceu em todas as seções eleitorais, seguindo uma tendência nacional com exceção do Nordeste. Como analisa esse comportamento do eleitor campista?

Rodrigo – O comportamento do eleitor campista seguiu uma tendência do Brasil com o voto de protesto daqueles que esperaram mudanças que não vieram em função das promessas dos políticos tradicionais. O voto pela mudança não necessariamente é para a melhor.  É algo extremamente arriscado que pode comprometer a democracia. Com exceção do Nordeste, onde o PT venceu com número de votos para Fernando Haddad, no restante do país, Jair Bolsonaro ganhou a preferência.

José Luis – O eleitor campista, como o eleitor nacional, internalizou o mito moralista que vingou nessa eleição. As elites campistas são tradicionalmente conservadoras, não me espantei. Mas, a massa da população passou pelo mesmo fenômeno nacional: internalizaram um mito moral na campanha, que demonizou tudo ligado ao PT, apoiando-se nos fatos criados pela Lava-Jato para criar um fantasma demonizado, fora de qualquer base concreta, se olharmos as informações veiculadas nas Fake News. O voto da grande maioria dos eleitores do 17 foi das camadas de mais baixa renda. O que ajudou a solidificar as fake news e a moralização foi a força de igrejas evangélicas pentencostais que disseminaram fake news. Eles votaram positivamente na crença de que votaram em quem segue a Bíblia e defende a família, a moral e os bons costumes. Com isso, fatores econômicos e de direitos sociais não tiveram quase nenhum peso nessas eleições.

Em sua opinião, o movimento pró-Bolsonaro, o antilulismo ou antipetismo estão ancorados pela classe média ou os mais ricos? A classe média ou os mais riscos estão mais inclinados “à direita”?  Como analisa o perfil do eleitor de Bolsonaro e do PT?

Rodrigo – No livro de Jessé Souza, “A elite do atraso”, reflete-se sobre a influência da classe média e dos mais riscos nas questões eleitorais em movimento antilulismo e pró-Bolsonaro.  Segundo o autor, há um sentimento de rechaçar o crescimento de movimentos populares. A proposta de Darcy Ribeiro de criar escolas de tempo integral foi rejeitada pela classe média quando seus filhos não tinham isso nas escolas onde estudavam.  Por outro lado, atualmente, isto não quer dizer que só a classe média e a classe alta votam em Bolsonaro.  No entanto, o Nordeste brasileiro possui características particulares e fenômenos culturais, políticos e econômicos. O escritor Jessé Souza faz críticas ao PT e à falta da autocrítica do partido ao não assumir suas culpas em pactos e alianças errados, apesar dos acertos das gestões petistas. As consequências se mostram nas urnas.

José Luis – Veja bem, por um lado, sem dúvida o movimento pró-Bolsonaro tem uma âncora poderosa nas classes médias e altas, por convicção. Vejo como a maior razão a herança perversa das nossas elites em rejeitarem qualquer movimento de ampliação dos direitos e diminuição das desigualdades entre pobres e ricos. O maior exemplo disso é que a corrupção foi o pretexto para tirar Dilma e a ação do Temer foi tirar direitos e congelar investimentos sociais por 20 anos, sem mexer nos privilégios dos poderes Judiciário e Legislativo, os mais caros do mundo, sem cobrar as dívidas empresariais acumuladas, e acabar com as desonerações e promover um imposto de renda progressivo, cuja economia seria de dez vezes o custo das políticas sociais. O que fica evidente é a perda e retração dos direitos. Também no campo dos valores e do comportamento, essas classes médias e altas rejeitam equiparação dos negros, das mulheres e dos LGBTS. Nossas elites são das mais atrasadas e bárbaras da humanidade. Mas, essas elites são um percentual muito pequeno dos eleitores. A maior parte dos eleitores de Bolsonaro foi das classes mais baixa  em termos econômicos.

Com essa reação em favor do candidato do PSL e menos favorável ao candidato do PT ao fim do primeiro turno, é possível reverter o quadro no segundo turno?

Rodrigo – Nas outras eleições, quem ganhou em primeiro turno repetiu o resultado no segundo turno.  Dificilmente Fernando Haddad reverte o resultado. Podemos já considerar a vitória de Jair Bolsonaro. O que Haddad pode fazer é tentar diminuir a rejeição e apresentar propostas concretas ao eleitorado

José Luis – É muito difícil reverter o quadro no segundo turno, mas não é impossível. Os votos brancos e nulos foram quase um terço dos eleitores. Os fatores imponderáveis continuam atuando. O movimento anti-Bolsonaro tende a se unir em torno da defesa dos valores das liberdades democráticas e contra formas fascistas que orientam esse candidato

Há insatisfação com a classe política e com os últimos governos, a Alerj e o Congresso Nacional contarão com novos nomes. Arrisca projeção para os próximos quatro anos com os candidatos que vão para o segundo turno no estado e no governo federal?

Rodrigo – A renovação é importante, mas o sistema político é muito viciado e marcado por características comprometidas. Muitos filhos de políticos tradicionais não foram eleitos. Os filhos de Anthony Garotinho (que ficou fora da disputa para governador) se elegeram com votações bem aquém das votações anteriores que o ex-governador influenciava. Clarissa Garotinho conseguiu se eleger com 10% dos votos da outra votação e o candidato Romário apoiado por Garotinho conseguiu a quarta colocação. No Congresso, o Partido dos Trabalhadores segue influente, pois  a bancada do PT continua grande na Câmara Federal, apesar de ter caído de 65 para 56 deputados. E a segunda maior bancada vai pertencer ao PSL  com 52 deputados graças ao fenômeno Bolsonaro. Já no governo do estado do Rio  não há uma polarização entre Wilson Witzel e Eduardo Paes, mas o voto de protesto é uma marca com a bênção de Bolsonaro. O candidato Paes terá bastante dificuldade de reverter o resultado do primeiro turno.

José Luis– A renovação radical que ocorreu é extremamente interessante e merece muitos e longos estudos. Na onda da Lava-Jato muitos dos velhos caciques foram varridos. Mas, foram derrotados, também, vários candidatos identificados com o petismo e com a esquerda, na onda da demonização que se voltou para a eleição do prefixo 17. De outro lado, como houve um forte movimento em defesa dos direitos e dos pobres, vários candidatos da periferia e de movimentos sociais foram eleitos para as Câmaras Estaduais e para a Federal. Aumentou muito o número de eleitos entre os gays, os transexuais, os negros e as mulheres. Embora em minoria, a resistência democrática, republicana e pela equidade de direitos, saiu fortalecida. Difícil prever os próximos quatro anos antes do final do segundo turno. Depende de muitas variáveis. Mas, o quadro será novo em todos os sentidos: do espectro partidário, das relações entre os poderes, das políticas de Estado e de Governo, da prática política, das definições ideológicas e do embate de ideias e projetos. É possível que essas eleições politizem mais a sociedade brasileira. Temos que discutir o Estado Laico e a formação política do cidadão.

Independentemente de quem vença, como vê os próximos quatros anos no estado do Rio e no Brasil com os novos governantes eleitos?

Rodrigo – A polarização e o voto do protesto vão marcar o segundo turno. Ambos têm rejeição grande, mas praticamente é certa a vitória de Bolsonaro.  Independentemente de quem vença no Rio de Janeiro, o estado enfrenta uma grave crise econômica por conta de muitas dívidas.  Se Witzel vencer, ele enfrentará dificuldade de gerir por conta da inexperiência política. Há uma perspectiva de aumentar a arrecadação com a valorização do petróleo e isto é bom para Campos também. No entanto, há muitos desafios pela frente no Rio de Janeiro e no Brasil.

José Luís – Como vejo os próximos quatro anos? No Brasil e no Rio? Como falei, ainda é cedo, antes de terminar o segundo turno. Mas, serão governos predominantemente de direita, uns mais outros menos bolsonaristas.