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Campistas seguem a onda mais conservadora que avança no país

Analistas políticos analisam a reação do eleitorado, os fenômenos Jair Bolsonaro e Wilson Witzel, o avanço da direita conservadora

Geral
Por Ocinei Trindade
14 de outubro de 2018 - 0h01

Cientista social e professor da UFF e UCAM José Luis Vianna Cruz

Desde o último dia 7, quando se deu o primeiro turno das eleições gerais no Brasil, o país não consegue deixar o assunto de lado. Aliás, no dia 28, quando se dará o segundo turno, eleitores voltarão às urnas para decidirem entre Jair Bolsonaro (PSL) e Fernando Haddad (PT) para a presidente da República. Os fluminenses também escolherão entre Wilson Witzel (PSC) e Eduardo Paes (DEM) para governador do estado. De acordo com especialistas, a insatisfação do eleitor com os políticos tradicionais se refletiu neste pleito. Em Campos, o conservadorismo e o desejo por mudança e renovação foram verificados nos números expressivos de votos dados a Bolsonaro e a Witzel, seguindo uma tendência nacional para a direita.

Aparentemente, os eleitores mais ricos e da classe média estariam inclinados a votar nos candidatos como Bolsonaro e Witzel. Entretanto, de acordo com analistas políticos e os resultados das urnas, os eleitores mais pobres também se mostram descontentes com representantes de partidos como o PT, PSDB e MDB, siglas mais expressivas e mais atuantes na política do país e do Rio de Janeiro nas últimas décadas. Foram ouvidos Rodrigo Lira, professor da Universidade Candido Mendes e doutor em Sociologia Política;  José Luis Vianna Cruz – cientista social e professor da UFF e UCAM; além de Hamilton Garcia de Lima, cientista político e professor da Uenf.

Rio de Janeiro

Para o cientista político Hamilton Garcia, o candidato do PSC ao governo do Rio, Wilson Witzel, surfou em uma onda conservadora sem ter uma vida pública pregressa, sem que se conheça suas ideias. “Isto foi possível graças ao descrédito dos candidatos, inclusive os primeiros colocados nas pesquisas ao longo da campanha, e ao colapso dos grandes partidos políticos no estado”. Afirma.

Rodrigo Lira, professor da UCAM e doutor em sociologia política

Segundo o professor e doutor em sociologia política, Rodrigo Lira, o candidato Wilson Witzel foi uma grande surpresa ao ir para o segundo turno, principalmente por ter avançado e superado os 40% dos votos válidos. “Isto é mais um efeito do fenômeno Bolsonaro que a gente atribui a um sentimento de protesto e revolta, movimentos anticorrupção e antipetismo. Dias antes da eleição, Bolsonaro declarou voto ao juiz Witzel e declarou apoio candidato ao Senado, Arolde de Oliveira, que se elegeu e superou o favorito na disputa, Cesar Maia”, lembra.

O cientista José Luis Vianna também destaca a subida rápida, meteórica e em curto espaço de tempo do Witzel e de vários candidatos a governador, deputado e senador em outros estados “Fatores imponderáveis atuaram nessas eleições. Por enquanto, são especulações, mas podemos afirmar que a onda do 17 arrastou os candidatos de prefixo 17. A atuação da campanha do 17 nas redes sociais foi extremamente profissional, com prováveis ligações de grupos relacionados ao esquema que influenciou nas eleições americanas, elegendo o Trump. As fake news e o controle exercido sobre a seleção e circulação das informações nas redes sociais foi fundamental como ferramenta”, afirma.

Eleitores de classe

O conservadorismo imprimiu marcas nas urnas. Inicialmente, acreditou-se que os movimentos pró-Bolsonaro partiram exclusivamente da classe média e dos mais ricos, mas na prática a receptividade do candidato do PSL à presidência é bastante alta entre os mais pobres. A necessidade de renovação foi refletida neste pleito como se viu. “Em Campos, a onda renovadora já se expressara na eleição de 2016, varrendo os candidatos situacionistas que se revezavam no poder, sem, todavia, ter se firmado como uma alternativa política aos grupos tradicionais, o que deixou o caminho aberto para a avalanche conservadora em meio à agonia dos grupos tradicionais, em particular o garotismo”, observa Hamilton Garcia.

Para Rodrigo Lira, o comportamento do eleitor campista seguiu uma tendência do Brasil com o voto de protesto daqueles que esperaram mudanças que não vieram em função das promessas dos políticos tradicionais. “O voto pela mudança não é necessariamente para a melhor. É algo extremamente arriscado que pode comprometer a democracia. Com exceção do Nordeste, onde o PT venceu com votos para Fernando Haddad, no restante do país, Jair Bolsonaro ganhou a preferência”, analisa.

De acordo com José Luis Viannao eleitor campista, como o eleitor nacional, internalizou o mito moralista. “As elites campistas são tradicionalmente conservadoras, não me espantei. Mas, a massa da população passou pelo mesmo fenômeno nacional: internalizaram um mito moral na campanha, que demonizou tudo ligado ao PT, apoiando-se nos fatos criados pela Lava Jato, além da veiculação das fake news. O voto da maioria dos eleitores do 17 foi das camadas de mais baixa renda. O que ajudou a solidificar as fake news e a moralização foi a força de igrejas evangélicas pentencostais. Eles votaram positivamente na crença de que votaram em quem segue a Bíblia e defende a família, a moral e os bons costumes. Com isso, fatores econômicos e de direitos sociais não tiveram quase nenhum peso nessas eleições”, acredita.

Hamilton Garcia, cientista político e professor da Uenf

A onda bolsonarista

Para Hamilton Garcia, o bolsonarismo surge no vácuo da crise das esquerdas e dos sociais-liberais, grupos que dominaram a cena política sem serem capazes de enfrentar os grandes desafios nacionais em abordagens sincrônicas, ou seja, combinando o progresso econômico do país com as políticas públicas. “O descasamento das expectativas (inclusão) com a realidade (produção) está na raiz da crise que vivenciamos, com elites populistas, de esquerda e de centro, distribuindo renda a todos os estratos sociais sem preocupações outras que não o retorno eleitoral de curto e médio prazos” analisa.

Rodrigo Lira faz referência ao livro de Jessé Souza, “A elite do atraso”, para refletir sobre a classe média e sua influência nas questões eleitorais, os movimentos antilulista e pró-Bolsonaro.  “Segundo o autor, há um sentimento de rechaçar o crescimento de movimentos populares. A proposta de Darcy Ribeiro de criar escolas de tempo integral foi rejeitada pela classe média quando seus filhos não tinham isso nas escolas onde estudavam. Por outro lado, atualmente, isto não quer dizer que só a classe média e a classe alta votam em Bolsonaro. O PT sem autocrítica e sem assumir suas culpas em pactos e alianças errados, as consequências  se mostram nas urnas”, considera.

Segundo José Luis Vianna, o movimento pró-Bolsonaro tem uma âncora poderosa nas classes médias e altas, por convicção. “Vejo como a maior razão a herança perversa das nossas elites em rejeitarem qualquer movimento de ampliação dos direitos e diminuição das desigualdades entre pobres e ricos”, define.  O cientista social faz outras críticas. “Nossas elites são das mais atrasadas e bárbaras da humanidade. Mas, essas elites são um percentual muito pequeno dos eleitores. A maior parte dos eleitores de Bolsonaro foi das classes mais baixas em termos econômicos”.