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Voz das ruas silenciada

A apatia da população diante dos diversos cenários políticos onde todos parecem meros figurantes

Política
Por Marcos Curvello
7 de agosto de 2017 - 0h01
Praça São Salvador está cada vez mais silenciosa quando o assunto é protesto contra a corrupção (Foto: Silvana Rust)

Praça São Salvador está cada vez mais silenciosa quando o assunto é protesto contra a corrupção (Foto: Silvana Rust)

A Câmara dos Deputados rejeitou nesta quarta-feira (2) a inédita denúncia de crime comum contra um presidente em exercício com as ruas vazias. Michel Temer foi acusado de corrupção pela Procuradoria Geral da República (PGR) e viu os parlamentares barrarem o prosseguimento da ação no Superior Tribunal Federal (STF) sem lobos ao portão. Para alguns, sinal de um tempo bem diferente de outro não muito distante. Há cerca de um ano, quando a ex-presidente Dilma Rousseff encarava um processo de impeachment por crime de responsabilidade, manifestações contrárias e favoráveis à sua saída eram notícia comum. Este esvaziamento viria se repetindo no Estado do Rio e no município de Campos — que chegou a ver um abaixo-assinado virtual por uma Câmara Limpa ganhar as ruas na esteira dos primeiros resultados da Operação Chequinho, da Polícia Federal (PF). Uma breve conversa com campistas nas ruas mostra abatimento e falta de esperança com a condução política em todas as esferas. Letargia que viria na ressaca de lutas que a maioria dos ouvidos considera “infrutíferas”. A avaliação de parte da população é de que “reclamar não adianta” e que “as coisas acontecem” a despeito de manifestações, numa repetição do Davi versus Golias com que normalmente é retratada a relação entre o cidadão e o Estado. Para o cientista político José Luis Vianna, trata-se de “um momento difícil de interpretar”.

“São muitas variáveis, que diferem entre as camadas da população, os mais pobres e com pouca informação e senso crítico da política; os mais politizados, mas teleguiados pelas suas referências para formar opinião; os acadêmicos e intelectuais de direita e de esquerda; os militantes divididos ante as táticas e estratégias possíveis; e os partidários e cúmplices dos esquemas já existentes, que se quer extinguir. Momento rico de complexidade, difícil de ser analisado e sofrido demais”, avalia Vianna.

Mesmo assim, o cientista político sugere algumas explicações. “Quando o pós-impeachment jogou o país nos braços dos corruptos de sempre, houve um arrefecimento das manifestações. Além disso, estamos sem alternativas para o
pós-Temer que aglutine o país. No nível estadual, acredito que haja um mito de desesperança de solução a curto prazo e de cansaço diante da protelação, bem como de impotência ante o fracasso das pressões realizadas pelas manifestações. E no local, as idas e vindas das decisões judiciais acabam cansando. Tudo fica contaminado pela desconfiança”, opina.

Praça era palco de manifestações para mostrar o descontentamento com algum episódio político (Foto: Silvana Rust)

Praça era palco de manifestações para mostrar o descontentamento com algum episódio político (Foto: Silvana Rust)

Rejeição generic nolvadex
Representantes de entidades tradicionalmente combativas da sociedade civil organizada também vêm esmorecimento dos ânimos políticos. Para Vitor Menezes, o presidente da Associação de Imprensa Campista (AIC), a situação na cidade reflete o que acontece no Brasil. “Essa apatia não é apenas do campista, mas de todo o País. A descrença geral na política e nos políticos está gerando uma perigosa atitude de negação das questões coletivas”, crava.

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O jornalista afirma que este quadro favorece uma postura individualista e de autotutela, que dilui o senso de sociedade. “É como se cada um tivesse que cuidar de si, pois não haveria muito que esperar de quem nos representa. No máximo buscam-se laços de proteção e pertencimento em outras formas de coletividade, como igrejas ou entidades não diretamente relacionadas com a política tradicional”, avalia Menezes.

Já o presidente da 12ª Subseção da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) de Campos, Humberto Nobre, afirma não ver mais “nem os ativistas de sofá”. “Eles, ao menos mantinham aceso o inconformismo, quando batiam panelas sempre que lhes retiravam suas novelas”. Para o advogado, que qualifica o país como uma “escancarada cleptocracia”, a passividade não se reverterá em melhorias para a população em nenhuma esfera e qualquer resultado neste sentido depende de engajamento.

“Não dá para esperar por heróis, tampouco por salvadores. Não dá para esperar que outros resolvam nossos problemas. Que os poucos resistentes, e também só enxergo os sindicatos neste momento, consigam resistir até que o restante da população participe da condução para um país e uma sociedade mais justa para nossos concidadãos” diz Nobre.

Presidente da Câmara dos Dirigentes Lojistas (CDL) de Campos, Joilson Barcelos lembra o engajamento da entidade e afirma que ela continua fazendo “a sua parte”. “A CDL é uma das entidades mais politizadas da região, embora não seja partidária. Sempre agimos como agentes provocadores de uma série de demandas e atuamos em defesa de questões que atendem parte importante da sociedade de Campos e até cidades vizinhas. Desempenhamos papel importante na manutenção ou na suspensão
de políticas e agentes públicos no município e no estado e temos travado um diálogo contínuo com o Prefeito Rafael Diniz (PPS), a quem sugerimos a criação de um conselho que ajudará na elaboração de ações e na fiscalização de projetos”, garante Joilson.

Resistência
Membro do Diretório Central dos Estudantes (DCE) Fernando Santa Cruz, da Universidade Federal Fluminense (UFF), o estudante de Ciências Sociais Bruno Azevedo discorda do diagnóstico de apatia e garante que, pelo menos em Campos, ainda há resistência.

“O povo tem consciência da gravidade das medidas tomadas, mas se vê sem alternativas. Não tem esperança na política institucional. Isso, somado ao momento de crise econômica que vivemos, leva a uma total falta de fé na mudança. Isso não quer dizer que o povo concorde com o que está sendo feito, apenas não vê saídas para mudar o que está aí”, diz.

Segundo Bruno, desde o impeachment de Dilma, que qualifica como “golpe”, “muitas lutas foram tocadas” pelos estudantes e outros setores da sociedade campista. “Somente este ano, na luta contra a Reforma da Previdência surgiu o Movimento Unificado Social, Sindical e Estudantil (Muse) do Norte Fluminense, que uniu sindicatos, partidos, movimentos sociais estudantis, organizando atividades contra o Governo Temer. O Muse construiu duas greves gerais em Campos e colocou mais de mil pessoas na rua”, acrescenta, lembrando, ainda, “as mobilizações dos servidores estaduais contra os atrasos nos salários, dos moradores do Morar Feliz II e dos trabalhadores e estudantes contra o fechamento do Restaurante Popular”.